O Artista
Luciano Henrique
Pereira de Figueiredo nasceu em Fortaleza, em 1948. É filho da juazeirense
Nazaré Pereira. Artista intermídia, designer gráfico, cenógrafo e pintor.
Iniciou a vida profissional nos anos 1960 como cenógrafo, em Salvador. Em 1967,
participou da 9ª Bienal Internacional de São Paulo. Transferiu-se para o Rio de
Janeiro em 1969, e passou a criar cenografias para shows musicais e peças de
teatro e a desenvolver projetos gráficos para discos, livros e revistas, entre
elas, a Navilouca, editada pelos poetas Torquato Neto (1944 - 1972) e
Waly Salomão (1944 - 2003). Entre 1972 e 1978, viveu em Londres, onde estudou
história da arte e literatura inglesa, interessou-se pelas possibilidades
visuais da página impressa de jornal e, com base em pesquisas, desenvolveu
pinturas e objetos tridimensionais com colagens, malhas de arames e relevos
monocromáticos. De volta ao Brasil, no fim da década de 1970 e início da
seguinte, trabalhou como diretor de arte em filmes do cineasta Júlio Bressane.
Entre 1981 e 1995, atuou como diretor técnico do Projeto Hélio Oiticica, no Rio
de Janeiro, e em 1994, foi o responsável pelas salas especiais Hélio Oiticica e
Lygia Clark, na 22ª Bienal Internacional de São Paulo. Foi nomeado diretor do
Instituto Nacional de Artes Plásticas, da Fundação Nacional de Arte – Funarte,
em 1986 e fundou o Instituto Nacional de Artes Gráficas no mesmo órgão, dois
anos depois. Paralelamente, realizou diversas exposições de pinturas e objetos
em galerias do Rio de Janeiro e São Paulo. As mais recentes exposições individuais de
Luciano foram realizadas no Musée Departamental de GAP (França, 2005), LURIXS
Arte Contemporânea (Rio de Janeiro, 2004), Galeria Anna Maria Niemeyer (Rio de
Janeiro, 2001), Galeria André Milan (São Paulo, 1999), Vila Costebelle (Nice,
França, 1999) e no Paço Imperial (Rio de Janeiro, 1998). As coletivas mais
recentes foram Tudo é Brasil, Paço Imperial (Rio de Janeiro, 2004), Arte
Contemporânea Brasileira nas Coleções do Rio, MAM/RJ, (Rio de Janeiro, 2004),
Foto Arte, Centro Cultural Banco do Brasil (Rio de Janeiro, 2002), Trajetória
da Luz na Arte Brasileira, Itaú Cultural (São Paulo, 2001), Rio Trajetórias,
Funarte (Rio de Janeiro, 2001) e Jornal Aberto, Museu do Telefone (Rio de
Janeiro, 2000).
A Exposição
A mostra que chega a Fortaleza é uma evolução do
que foi aprsentado no Rio de Janeiro, ainda em 2006. A este propósito,
transcrevemos um texto do poeta e ensaísta Antonio Cícero, que pode ser
consultado em http://revistazcultural.pacc.ufrj.br/artes-visuais-luciano-figueiredo-do-jornal-a-pintura/
“A esplêndida exposição retrospectiva da obra de
Luciano Figueiredo que o Paço Imperial abrigou entre 5 de setembro e 5 de
novembro de 2006, no Rio de Janeiro, revelou uma trajetória ao mesmo tempo
múltipla, complexa e singularmente consistente. O título “Do jornal à pintura”,
não deixa de dar, por alto, uma descrição sumaríssima dessa trajetória. Caso se
tratasse, porém, do título de um capítulo da biografia de Luciano, então – dado
que, nos seus anos de formação, na Bahia, ele se dedicou à pintura – esse
capítulo teria que ser precedido por outro, intitulado “Da pintura ao jornal”.
Tudo somado, teríamos, portanto, “Da pintura ao jornal” e “Do jornal à
pintura”: em suma, “Da pintura à pintura”. Posto isso, não pretendo, de maneira
nenhuma, diminuir a importância do jornal na obra de Luciano. Ao contrário, ele
é central no percurso que, muito esquematicamente, descreverei a seguir. No
final da década de 1950 e de 1960, no Brasil, no campo das artes plásticas, a
partir do Concretismo e do Neoconcretismo, os artistas de vanguarda, baseados
em considerações e experimentações sob alguns aspectos semelhantes, mas, sob
outros, diferentes das que haviam sido feitas na Europa pela vanguarda
histórica, sentiram a necessidade de quebrar as compartimentações, as
categorias e os gêneros artísticos. O Tropicalismo, por sua vez, levando a
experimentação ao terreno da mídia (que estava então sendo repensada, de modo
revolucionário, por Marshall McLuhan), ocasionou na prática o questionamento da
própria distinção entre o erudito e o popular, entre a vanguarda e a indústria
cultural. Ao pôr em xeque as hierarquias culturais tradicionais, bem como as
formas convencionais de arte e de vida, a contracultura dos anos 60 e 70, não
só no Brasil, mas em todo o mundo, abriu a perspectiva da produção de
invenções, transformações e cruzamentos antes insuspeitados. Frente às
possibilidades criativas então disponibilizadas e à atração da experimentação,
Luciano – que, no entanto, já havia participado da Bienal Nacional de Artes
Plásticas (1966) e da Bienal Internacional de São Paulo (1967) – perde o
interesse pela carreira convencional de pintor. Em vez disso, a partir de 1969,
quando decide morar no Rio de Janeiro, ele estabelece parcerias extremamente
fecundas com artistas como o poeta Waly Salomão (fazendo, por exemplo, o
cenário do show de
“Fa-tal”, de Gal Costa, e, junto com Óscar Ramos, o layout da revista Navilouca) e Hélio Oiticica (fazendo
o cenário do espetáculo “Gal deixa sangrar”). Fortemente atraído pelo
Concretismo e pelo Neoconcretismo, ele dirige seus estudos, pesquisas e
experimentos numa direção construtivista. Nessa mesma época, Luciano produz
diversas capas de discos e livros. Em 1972, Luciano vai morar em Londres e,
livre do fetichismo da pintura, deixa-se impregnar pela poesia, pelo cinema,
pelo grafismo, elementos que estarão, a partir de então, presentes em quase
todas as suas obras. Já nas colagens como “Solaris Compass”, “Noir” e
“Chiaroscuro Sky” pode-se observar que ele não parte da natureza nem tenta
encontrá-la. É no imaginário artificial de nossa época, produzido pelo cinema,
pela canção, pela literatura, pelo jornal, que vai buscar os elementos
heterogêneos – tais como sintagmas retirados de poemas de Ezra Pound ou trechos
de diálogos de filmes de Nicholas Ray – que reúne ao construir ou editar obras
que funcionam como verdadeiros ideogramas, em que sobreposições visuais e
verbais surpreendentes e estimulantes solicitam a revitalização da nossa sensibilidade
e do nosso intelecto. Ainda em Londres, Luciano descobre as possibilidades
plásticas do jornal. “Todo jornal, da primeira linha à última, não passa de um
tecido de horrores”, dizia Baudelaire, numa sentença que Luciano gosta de
citar. Puramente instrumental, ele é diariamente lido, descartado e usado como
papel (anti-)higiênico pelos mendigos. Para quem o lê, a notícia – a mensagem –
é a única coisa que importa. Ora, invertendo a hierarquia que preside à lógica
instrumental tanto do cotidiano quanto da sociedade que o produz, Luciano
desinstrumentaliza o jornal. “Foi precisamente o que não era notícia no jornal
que chamou minha atenção”, diz ele, já de volta ao Brasil, em 1984. “Comecei a
ver as páginas como um mosaico, com todas as suas variações cromáticas: o chiaroscuro, as linhas, a qualidade
das fotografias impressas. Tudo isso me fez consciente de uma espécie de
natureza particular, não calculada, não destinada a fazer parte da notícia. As
páginas começaram a agir como um resíduo muito excitante. À medida que me
afastava da notícia em si, uma contra-leitura provocava novas relações de
espaço-luz-sombras. As páginas tornavam-se vibrações óticas sugeridas pela
realidade inesperada que continham.” É, portanto, de um dos produtos dos
cálculos da indústria cultural que a arte de Luciano extrai uma espécie de
natureza incalculável. É no mundo existente, no dado, no mediato, no midiático
que ela mergulha para redescobrir o lugar (o topos, não a utopia) do espanto. A oportunidade de observar as
etapas através das quais o desenvolvimento e o aprofundamento da experimentação
com o jornal conduz à pintura é certamente o aspecto mais fascinante da
presente exposição. Por volta de 1990, a cor que ele introduz nas obras
intituladas “Relevo” realça as qualidades plásticas das dobras, dos cortes, dos
caimentos do papel do jornal. Ou bem essas obras são inteiramente
monocromáticas ou uma única cor contrasta com a cor original do jornal. Em
1998, ele declara que o que lhe interessa é “uma espécie de dinâmica de planos,
produzida pela manipulação de páginas, folhas, pelo ato de virar as páginas,
pelos volumes, pela luz e a sombra, peloschiaroscuros.
Os movimentos das figuras retangulares demonstravam uma operação orgânica
revelada pelo contato com as páginas”. A partir de 2000, ele produz a belíssima
série “Diorama”, de obras retangulares que consistem em acrílico sobre jornal,
papelão e/ou madeira. De modo fiel à etimologia da palavra (“aquilo que é visto
através”), todos os elementos que compõem essas obras se encontram à mostra.
Assim, vários planos transparentes de jornais e de cor se sobrepõem sem ocultar
uns aos outros, e sem escamotear sequer o suporte sobre o qual se colam, de
modo que este – a madeira, por exemplo – também funciona como um componente
formal da obra. A partir de então, o jornal que, enquanto tal, passara a ser
apenas um dos constituintes da obra total, é até capaz de desaparecer
totalmente. É o que acontece nos “Muxarabiês” que, consistindo em acrílico
sobre madeira, são pura pintura. Entretanto, como essas obras incorporam o que
Luciano aprendeu com o jornal, a memória deste é, de certo modo, preservada por
elas. A própria presença formal da madeira, a transparência dos planos, a
sutileza cromática, a articulação construtiva da cor e do espaço, a exclusão de
qualquer ilusionismo, em suma, a ambição de que todos os componentes da obra,
sem mistificação alguma, se revelem e, ao se revelar, resplandeçam, tudo isso
nos induz a uma espécie de arqueologia visual que remete, como a uma matriz, às
experimentações de Luciano com o jornal. Da pintura à pintura: vê-se que foi
necessário abandonar/perder a pintura para poder um dia reencontrá-la: ou
melhor, reinventá-la.”
O Serviço
A Exposição do artista Luciano Figueiredo, Do
Jornal à Pintura, estará sendo aberta,
das 19:30 às 23:00h, no próximo dia 4 de outubro, na Galeria Multiarte, à Rua
Barbosa de Freitas, 1727 – Aldeota. Para facilitar o acesso, a Galeria dispõe
de estacionamento com manobristas. O período da Exposição é de 05.10 a
01.12.2012, com visitas no horário de 14 às 20h.
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