quarta-feira, 8 de abril de 2015

 BOA TARDE (I)
Dou continuidade à publicação nesta página das pequenas crônicas que estão sendo lidas no Jornal da Tarde (FM Rádio Padre Cícero, 104,9 de Juazeiro do Norte) nos dias de segundas, quartas e sextas feiras, sob o título Boa Tarde para Você.
139: (03.04.2015) Boa Tarde para Você, Ivan do Nascimento Freire Lopes
Devo dizer que ainda me causa surpresa a estima e o reconhecimento que tenho colhido pelas ruas, em manifestações diversas de afeto e carinho que muitos de nossos ouvintes têm confessado a mim e a pessoas de nossa equipe, com respeito à qualidade destes escritos semanais. Procuro ser o mais simples possível e até me desculpo se meu vocabulário tem algo de sofisticado, por vezes de pernóstico, se o palavreado empregado pode trazer alguma coisa estranha para um cronista do cotidiano que procura reunir memória, pessoas, homenagens e a atualidade de nossa vida. Não foi diferente com você, Ivan, como também não foi para outros que já o fizeram por escrito, trazendo para este tão modesto cronista a emoção dos seus sentimentos, com o conforto espiritual diante destas páginas que lhes tocam e que encarei como uma experiência notável em minha vida. Relevo particularmente o fato de ser você um professor, um colega de lida em sala de aula, graduado em Letras, com habilitação em Língua e Literatura pela nossa URCA e que tem procurado burilar esta vocação com especializações na matéria e na atividade docente no Ensino Superior. Muito me agrada saber que na docência, Ivan, você é daqueles que se desdobram no esmero profissional, distribuindo o brilho desta competência por instituições como escolas da rede pública, faculdades e universidade estadual, além da nossa Fundação Educativa Salesiana Padre Cícero, e também nesta emissora. Ao ler o seu currículo, coisa que faço curiosamente a cada novo colega que identifico, apresento-lhe os meus cumprimentos com atraso porque você obteve recentemente o seu mais novo título de Mestre, fato notável na carreira universitária que abraçamos. É oportuno dizer para todos nós que isto aconteceu ao final do ano passado, na Universidad de Santiago do Chile, a principal universidade pública daquele pais, quando sob a orientação do prof. Jaime Caiceo Escudero, você defendeu a sua dissertação na área de currículo e avaliação, exatamente duas das maiores preocupações da qualidade do ensino. Aliás, cabe aqui também uma menção explicita sobre este seu orientador, pois o prof. Jaime Caiceo é reconhecidamente um dos educadores de grande envergadura na América Latina, se dedicando particularmente à formação de novos quadros docentes e pessoa muito premiada em diversas instituições educacionais no Chile, Argentina, Colômbia, Espanha e Brasil. Poderia ir mais adiante relevando em você, Ivan, grandes méritos e o fazendo publicamente, por seu envolvimento em nosso Colégio Salesiano com projetos importantes como o “Aprofundamento de Leituras”, cuja ideia é estimular a leitura dos alunos salesianos e a produção de ensaios inspirados pelo tema “Nos dias de hoje, devemos reformar o Brasil?”. Sem dúvida, Ivan, isto é de fundamental importância, pois se trata da disseminação de uma cultura pelo gosto e prazer na leitura, além de conhecimento de periódicos que circulam no nosso país, e como você mesmo diz, “para criar relacionamentos e público leitor por fruição”, a ponto de prepara-los para a tarefa urgente de reformar este país. Costumo pensar, caro amigo, o quanto esta missão que nos cabe, esse autêntico “ministério educacional”, é algo de grande importância que deve ser visto na sociedade contemporânea, pois aí residem os instrumentos mais eficazes para esta transformação tão necessária. Cabe a você, a mim – aposentado que de tão impaciente voltei correndo à sala de aula, à Maria – professorinha dedicada nas mais recuadas e modestas escolinhas no interior deste país, aquilo que não sabemos explicar, mas que seguramente corre nas nossas veias, feito sangue velho de avós, para nos completar na nossa ansiedade de servir e ser instrumento desta nova redenção. Esta, felizmente, é a nossa crença, aquela certeza que nos move para realizar sempre e cada vez melhor, o que nos cabe fazer pelo futuro desta grande nação e por cada um dos seus filhos. 
Saúdo nesta tarde e cumprimento você, Ivan do Nascimento Freire Lopes, por seus predicados profissionais, mas também por conta deste serviço exemplar que sua história de vida nos mostra, aproveitando a oportunidade para apresentar-lhe os meus votos de uma Feliz Páscoa na paz de Cristo Ressuscitado. 
(Crônica lida durante o Jornal da Tarde, da FM Padre Cícero, Juazeiro do Norte, em 03.04.2015)

BOA TARDE (II)
140: (06.04.2015) Boa Tarde para Você, Francisca Giselle Cruz
No início de 2002, no Laboratório de Biotecnologia, do Centro de Ciências Agrárias da UFC, no Campus do Pici, em Fortaleza, eu recebi sua visita, Giselle, e nem a conhecia, para uma conversa que pouco demoraria, porque você foi direto ao assunto me dizendo: “eu vim para trabalhar com o senhor”, como se também me dissesse “e não me diga não”. Você há pouco concluíra o curso de graduação em Tecnologia de Alimentos no Instituto Centec, na FATEC Cariri, e já se propunha a realizar o seu Mestrado em Tecnologia de Alimentos pela Universidade Federal do Ceará. Eu lhe confesso que esta origem, o Centec, era e será ainda para mim, uma destas mais importantes recomendações que se pode atribuir a um técnico de nível superior em nosso Estado, porque eu conhecia de perto a sua origem, a sua concepção, nas ideias de vanguarda do meu velho e querido amigo e professor Francisco Ariosto Holanda, seu criador. Sejamos breves e diretos, Giselle, como você ainda se conserva, para dizer que por três anos, apostei muitas fichas, eu a orientei naquele mestrado, concluído brilhantemente em 2005, quando me despedia da UFC, na minha extemporânea aposentadoria, com a bem cuidada pesquisa sobre novas perspectivas para a tecnologia de bebidas e alimentos no Estado do Ceará. Como alguém que lhe deu régua e compasso, eu já era feliz em saber de poucas e boas notícias de suas andanças, ditas sempre ao telefone por uma mãe quase aflita, sofrendo e vibrando pelas vitórias seguidas da filha que corria por faculdades e centros universitários do Ceará, da Paraíba, de Alagoas e de Minas Gerais. Finalmente, em 2010, você regressou ao Cariri, fixando-se no Instituto Federal de Educação, campus Crato, como docente das áreas de Aquicultura, Legislação Ambiental e Análise de Alimentos, sendo ainda mais coordenadora de Extensão, pesquisadora do Programa de Apoio à Produtividade em Pesquisa, e Líder do Grupo de Pesquisa junto ao CNPq. Hoje, Giselle, relendo notas desta sua caminhada profissional, senti algo que expresso como de profundo orgulho pessoal porque vejo que figuro ao lado de parte destas suas conquistas, manifesto sincero de sua gratidão para com o velho professor, como aquilo que se diz e que se destina ao mestre, com carinho. Há poucos dias eu a encontrei em matéria televisiva para demonstrar isto que a versatilidade da tecnologia de alimentos, por conhecimentos que você aprendeu e dinamiza, e que produz conhecimentos novos sobre alternativas para nossa alimentação, ao sabor de recursos pouco explorados, como é o caso dos pescados de água doce. Se você me perguntasse o que eu acho de uma buchada de tilápia, Giselle, eu talvez a decepcionasse como alguém que se mantém muito conservador no seu paladar, mas não deixaria de louvar esta iniciativa pelo que ela trás de inovador, não apenas na culinária, senão como desenvolvimento a embutir métodos, técnicas, processos e produtos que isto permite. A genialidade de um técnico em alimentos se atesta em tais situações, pois em mundo tão carente de soluções, coisas como estas parecem nos assegurar que de fato, como dizem os especialistas, muitos alimentos que devem chegar à mesa em tantas partes do mundo, neste início de terceiro milênio ainda não foram desenvolvidos, mas podem não estar longe de chegar aos mercados. Quero crer que este seja o desafio marcante a ser vencido, Giselle, com este mais amplo domínio sobre tais recursos, muitos dos quais ainda presos aos limites desta agricultura familiar, longe da extensão da produção para as escalas competitivas dos negócios. Comungo consigo nesta iniciativa, profundamente marcada por esta identidade solidária para com as graves insatisfações que persistem, pois o sistema se conserva perverso e cruel, arrastando uma quantidade expressiva de miseráveis que não tem para comer o pão nosso de cada dia. No mais, Giselle, eu ainda consigo reunir vibração e entusiasmo para sentir que tive enormes privilégios de ter encontrado em minhas salas de aulas, gente valiosa e determinada, como você que assim se mantém, fiel a uma vocação que renova todas as nossas esperanças no futuro. 
(Crônica lida durante o Jornal da Tarde, da FM Padre Cícero, Juazeiro do Norte, em 06.04.2015)

MOSTRA A DITADURA REVISITADA
O Cinematógrapho (SESC, Juazeiro do Norte), com curadoria e mediação de Elvis Pinheiro, dá sequência a Mostra A Ditadura Militar Brasileira Revisitada, com a exibição do filme Marighella, nesta quarta feira, dia 8. Documentário (Brasil, 2012), Dirigido por Isa Grinspum Ferraz, tendo no elenco Lázaro Ramos, como narrador. Sinopse: Carlos Marighella foi o maior inimigo da ditadura militar no Brasil. Este líder comunista e parlamentar foi preso e torturado, e tornou-se famoso por ter redigido o Manual do Guerrilheiro Urbano. Devido à ditadura militar, muito sobre os bastidores da época foi mantido em sigilo ou, no máximo, pouco divulgado. Natural, afinal de contas o país vivia um período onde a censura atuava com rigor, impedindo a publicação livre de notícias e opiniões. Nos últimos anos, o cinema brasileiro tem recuperado um pouco desta história, seja devido à vivência dos diretores mais antigos ou pelo próprio interesse da nova geração. Não há, por enquanto, um único filme que aborde a ditadura militar como um todo, ao menos não com a abrangência do ainda impactante Pra Frente, Brasil (1981). Mas há vários filmes que revelam trechos da época, como se pouco a pouco o cinema brasileiro fosse montando um quebra-cabeças sobre o assunto. Marighella é uma destas peças. Crítica: Muitos confundem documentário com trabalho jornalístico e acham que documentarista não pode tomar partido e está obrigado a ouvir todas as partes. Sem for da intenção do diretor, sim, o filme documental pode ser uma das formas possíveis - dentre muitas - de se fazer reportagem, com a vantagem de explorar com maior liberdade as possibilidades técnicas e narrativas. Se o propósito do autor for outro, não se deve condenar a parcialidade, apenas cobrar verdade no que é retratado. É assim com Marighella, filme dirigido por sua sobrinha, Isa Ferraz. O longa humaniza a figura do militante mostrando detalhes da intimidade familiar e do círculo de amigos de luta deste ícone da ícone da esquerda brasileira, baleado e morto dentro de um Fusca em 1969, em São Paulo. Um olhar singular e interessante que só quem era de dentro da família seria capaz de documentar, com a vantagem de não mitificar ainda mais a figura de Marighella, levando às telas o ser humano por atrás do revolucionário ilustre dos quadros da Ação Libertadora Nacional. A diretora reúne entrevistas com militantes que combateram ao lado do guerrilheiro, de Clara Charf, sua viúva, de seu filho Carlos Augusto Marighella e de figuras notáveis na resistência à ditadura, como o professor Antonio Candido. O filme conta também com a narrativa em off de poemas e escritos de Marighella, interpretados pelo ator Lázaro Ramos. A ausência de registros filmados de Marighella - não existem imagens dele em movimento - é compensada por imagens da época retratada e fotografias familiares. O documentário revela ainda algumas pepitas garimpadas por Isa, como documentos secretos da CIA sobre Carlos Marighella e uma entrevista inédita dada por ele à Radio Havana, em 1967, e encontrada em perfeito estado de conservação. Marighella não é um documento jornalístico sobre a figura controversa do guerrilheiro que pegou em armas contra a ditadura. Isa não ouviu o outro lado. Seu filme não é imparcial, mas uma homenagem ao tio, o baiano poeta, misterioso aos olhos da menina Isa, que sempre desaparecia, por força da militância política, e, sem prévio aviso, retornava. Até o dia em que não mais voltou. Um trabalho pessoal e afetivo, mas que com suas imagens ajuda a reaver a memória política do país. (Por Roberto Guerra, http://www.cineclick.com.br/criticas/marighella-2011)