BOA
TARDE
Dou continuidade à publicação nesta
página das pequenas crônicas que estão sendo lidas no Jornal da Tarde (FM Rádio
Padre Cícero, 104,9 de Juazeiro do Norte) nos dias de segundas, quartas e
sextas feiras, sob o título Boa Tarde para Você.
105: (07.01.2015) Boa Tarde para Você, Francisco Demontier Cândido
Tenório
Agradeço-lhe, mais uma vez, a sua
generosidade frequente, com o envio das matérias publicadas no Miséria, como a
de ontem, com a qual você relembrou aquele fatídico 6 de janeiro de 1950, o do
assassinato de Mons. Joviniano da Costa Barreto. Gostaria de dizer-lhe,
Demontier, que tenho muito gosto em ler estes seus textos, especialmente porque
você é dos poucos jornalistas desta mais nova safra que tem um cuidado especial
para com as lições do passado, indo sempre, como dizia um dos seus leitores, ao
baú da história para dali retirar elementos importantes para suas matérias. É o
caso deste capítulo horroroso que Juazeiro viveu naquela primeira sexta feira
do ano, quando o fato aconteceu, pelos anos por mim inteirado com os
comentários em família, e que me deixavam muito curioso para compreender a
trama e suas circunstâncias. Há uns bons anos, Demontier, eu venho procurando,
à luz de uma revisão de textos da imprensa e do panfletário, revisitar o
contexto da época, para tentar compreender o pretexto do brutal assassinato,
analisando as entrelinhas que guardaram opiniões e juízos que até perpetraram o
tresloucado gesto do doente mental Manoel Pedro da Silva. Monsenhor Joviniano
assistiu o nascimento de minha família, casando meus pais em 08.12.1948, na
Igreja-Matriz de Nossa Senhora das Dores, onde ele também me batizou na manhã
do dia 22.10.1949, 75 dias antes de morrer. Na minha adolescência, Demontier, a
tradição oral era de exaltação ao mártir, vítima de um negro maluco que teve a
sua pretensão contrariada, pois queria que Monsenhor fizesse o seu casamento
com uma mulher casada. Frequentei escolas e agremiações que não faziam, senão, a
elegia de seus grandes méritos de sacerdote cristão, à margem das grandes
intrigas, decorrentes da sua determinação de combater o Pe. Cícero e o
propalado fanatismo religioso da cidade. Tenho uma coleção de boletins
apócrifos que pontuavam os conflitos de grupos com Mons. Joviniano, marcados
por sua inequívoca perseguição, desde que assumiu a Paróquia de Juazeiro, com o
objetivo de destruir o amor que os romeiros manifestavam ao Padre Cícero. Esses
boletins, Demontier, são extremamente virulentos e a sua linguagem panfletária
não escondia uma trama que elegeu Pe. Cícero, romeiros, Salesianos e Diocese, e
que terminaria por armar o débil mental Manoel Pedro com uma peixeira para
assassinar Monsenhor. Veja só este pequeno trecho, meu amigo: “O Padre Cícero deixou no seu lugar os
Padres Salesianos. Os Padres Salesianos que tem vindo para cá, quando se
tornaram queridos dos romeiros, por causa da sua humildade e grandes virtudes,
e começaram a chamar a atenção dos romeiros para o Colégio. O Monsenhor
Joviniano começa logo a fazer campanha para botá-los para fora do Juazeiro.
Frei Damião está proibido pelo Monsenhor Joviniano, a nunca mais pisar aqui.
Mas, sabem vocês, romeiros, porque é isso? É por causa do dinheiro!!! Os
romeiros estavam se passando para os Salesianos, deixando a Matriz. As esmolas
da caixa de Nossa Senhora das Dores que o Monsenhor todos os anos despesca,
atingem a mais de quinhentos contos de reis e de agora em diante este dinheiro
ia para a construção do Templo de Nossa Senhora Auxiliadora. Esse dinheiro
atualmente está sendo desviado para o Bispado do Crato, para a construção de
casas da Obra das Vocações Sacerdotais, naquela cidade. Isto reverte em
prejuízo para o Juazeiro.” E vai por aí, meu amigo. Confesso a você,
Demontier, que da revisão destes momentos, ainda fica para mim a sensação de
que o cadáver de Mons. Joviniano, se revira no túmulo, a cada nova romaria que
nos chega, exatamente ele que achava que isto não duraria 10 anos. E,
desgraçadamente, 10 anos nem ele mesmo durou...
(Crônica lida durante o Jornal da Tarde,
da FM Padre Cícero, Juazeiro do Norte, em 07.01.2015)
ADENDOS
Eu me sinto na obrigação de fazer duas
considerações sobre qualquer repercussão com respeito a esta crônica que fiz
para saudar Demontier Tenório. A primeira diz respeito a detalhar um sem número
de fatos nos quais a pessoa de Mons. Joviniano da Costa Barreto esteve
envolvida e que refletiam a sua intolerância com respeito a Juazeiro e suas
questões políticas e religiosas. Isso não foi feito por falta de tempo de
rádio. Mons. Formava ao lado de prefeito juiz e delegado. E frequentemente eram
vistos e tratados como “Estado Maior” ou também chamada de “Corte Celeste”. Mas
os tempos eram outros: vivia-se ditadura política, mando inquestionável de
diocese e uma força policialesca acintosa. Essa conjuntura, por exemplo, bem
próximo do assassinato de Monsenhor Joviniano também o fortaleceu para não
abrir a pequena capela de São Miguel para receber o velório do beato José
Lourenço Gomes da Silva. Muitos anos depois, uma pessoa insuspeita com relação
a Mons. Joviniano, como o Pe. Azarias Sobreira Lobo me confidenciaria ainda com
muita tristeza. “Foi um grave erro, um grave pecado. O que pensar de um irmão
no sacerdócio que peca contra a caridade?” Ainda com relação a este assunto, eu
já tive oportunidade de registrar nesta coluna os detalhes deste fato, exibindo
algumas preciosas fotografias que mostravam como o velório do beato José
Lourenço transcorreu com grande afluência, debaixo de chuva e com as portas da
capela fechada por determinação do pároco Mons. Joviniano.
Outro fato que necessita complemento vem
do fato de ter inserido a frase: “Na minha adolescência, Demontier, a tradição
oral era de exaltação ao mártir, vítima de um negro maluco...” Tratei em assim
referir como de fato se dizia na época, onde o preconceito racial era ainda
muito mais flagrante que nos dias de hoje. Não há, da minha parte, nenhuma
simpatia para que o tratamento hoje seja mantido. Procurei, tão somente, ser
fiel ao sentimento da época, que está bem expressa nos jornais da época.
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