domingo, 16 de junho de 2013

SOB O SOL DE TOSCANA II

(11) Desde o dia 8 passado chegamos a San Gimignano, na província de Siena. É uma pequena cidade medieval na Toscana. Não tem mais que uns 8 mil habitantes, e vive basicamente de turismo. É bem verdade que também temos que associar os negócios de vinho (particularmente das variedades Vernaccia, Chianti e Brunello) e a produção de azeite de Oliva, extravirgem, principalmente. Fiquei residindo numa velha construção do século XII, quase original, apenas modernizada pelos equipamentos e algumas instalações como gás, eletricidade e aquecimento. Esta velha construção no sitio histórico da cidade primitiva, a uns 100 metros do centro da vila, era um castelo da nobreza agrária do lugar. Com o tempo passou a ser um Convento, depois uma sede de bispado, por ultimo uma prisão e hoje se divide em propriedade privada com apartamentos e a sede policia municipal. Um belo local para se conhecer um recanto paradisíaco da Toscana, que os italianos insistem em dizer que e a mais linda região do mundo. Não esta muito longe disto. 

 (12) Quando fiz menção, semanas atrás, de que relataria fatos e faria comentários, como se fora um romeiro do Juazeiro, pelas terras da Toscana, não tinha a menor idéia de que disto terminaria falando. E o caso de me referir a este momento, pois logo ao chegar em San Gimignano encontrei a noticia da chegada aqui da 10ª. Replica da Imagem de Nossa Senhora de Fátima, a Peregrina Senhora de Portugal. E achei uma coincidência muito grande que há 60 anos passados isto volte a me acontecer, pois residente em Juazeiro do Norte, lembro – como se diz, com estes olhos que a terra há de comer, da passagem ai de uma destas primeiras replicas que foi levada ao Cariri, em novembro de 1953, pelo Pe. Demontier. Temos, e oportunamente faremos, uma retrospectiva fotográfica desta peregrinação histórica para nós. A grande diferença, sem duvida, foi que agora sou bastante esclarecido naquilo que este fato representou. Mas, a emoção se recuperou no tempo.
 
(13) Pois bem, a Imagem Peregrina de Fátima chegou a esta região da Toscana através da Via Francigena, uma rota de peregrinação que se inicia na Catedral de Canterbury, Londres e vem ate Roma. Ela e muito conhecida, como a de Santiago de Compostela. São cerca de 80 trechos, variando de poucos quilômetros a um pouco mais de 40km. A via Francigena, nesta área, contempla diversos municípios. Acompanhei-a por uma ou duas horas, nos 4 dias em sua permanência em diversas igrejas de San Gimignano, como as de San Bartolo, Santa Fina, Santo Agostinho e a Catedral (Duomo). Em cada uma destas, pelas 18 horas havia uma missa, belissimamente cantada, que se seguia a recitação do terço e se completava com a Consagração e a procissão ate o novo destino, numa igreja dentro dos muros da velha cidade. Interessante observar que raras vezes esta celebração podia contar com umas 100 pessoas. Fiquei imaginando o que seria isto no Cariri. Mas aqui, não sei eu justificar o pouco interesse.

 (14) A propósito de Via Francigena, tive a curiosidade de enfrentar com um amigo de Stutgart (Alemanha), bem experimentado em caminhadas pela a Floresta Negra, por duas horas, um pequeno trecho dela entre San Gimignano e a localidade de Santa Lucia. Foi duro para este romeiro de pouca experiência, enfrentar o trajeto, por vezes muito íngreme, coisa de 30 graus de inclinação, a subir ou a descer, em altitudes de 100 a 200 metros. Depois de duas horas de caminhada, na maior parte por locais fascinantes que incluíam fazendas agro turísticas, monastérios, pequenas vilas, campos de oliva e de vinha, alem de vegetação exuberante, animais muito exóticos, dentre aves e animais silvestres (porcos e cervos), numa topografia de incríveis elevações, voltamos a nossa vila para um bom café da manha, pois tínhamos madrugado, num clima providencial, sem chuva e numa temperatura de 15 graus.

(15) Durante o trajeto da Via Francigena, menino matuto, não parei de pensar nos caminhos dos romeiros do Juazeiro do Norte, lamentando que eles não tenham ainda o devido acolhimento pelo poder publico, como esperamos. Toda a rota e sinalizada e o seu percurso e algo muito disciplinar, pois o motivo e essencialmente religioso. Pela tal Via, fui imaginando muitas coisas que nos vem à cabeça quando tratamos, não só no nosso caso, mas em muito outros, sobre o que rotulamos de Peregrinação, Turismo Religioso, ou simplesmente Turismo, mesmo sem tipificar (ecológico, histórico, lazer, etc.). E nisto temos muito  que aprender, e muito mais o que firmar, pois são objetivos muito distintos e não temos nenhuma autoridade para confundir as vias do fato, atropelando este potencial que a todos nos interessa. Por exemplo, neste instante em que o Estado Italiano enfrenta uma crise muito aguda, percebe-se aqui que e necessário firmar condutas e tratamentos muito bem delineados para que Estado, Igreja, classes produtoras, todos tenham destas vocações, de suas crenças, o melhor resultado.

(16) Uma das melhores menções que poderemos fazer a respeito deste instante crucial vivido pelo povo italiano e a sua tenacidade para superar a crise. Falo especialmente das pequenas comunidades do interior do pais, e mais objetivamente do papel da mulher. Encontrei inúmeros casos bem patentes deste desempenho formidável, realizando um novo papel, bem alem do mais simples, domestico, empreendedoras, novas comerciantes e criando espaços muito versáteis para negócios novos, tanto na agricultura, como no comercio das vilas. Uma cena bastante triste e encontrar pessoas que a primeira vista fazemos um juízo de gente de bem, bem vestidos, falando das suas próprias dificuldades, mas perambulando, em busca de oportunidades de emprego. Conversei com vários, lamentando o que se passa, de modo particular pelo declínio da produção e levando os mais velhos a um estado de penúria, e esmolando pelas praças das cidadezinhas. Assim encontrei muitos.           

(17) Turismo na Itália não e coisa barata para brasileiro. Mas, o pais esta cheio (modo de dizer) de brasileiros por todos os lugares. Na Toscana, principalmente, eles podem chegar este ano a uns dois milhões, me dizem dados das agencias de turismo. O que eles procuram por aqui, se pode resumir a curiosidade pela beleza natural de toda a região, alem dos vinhos como Chiantis, Brunelos e os típicos de diversas comunas que tem a chamada Designação de Origem Controlada e Garantida (DOC ou DOCG). Estes são os passaportes para firmar pequenas vinícolas, algumas que não produzem mais que 5000 litros por ano. Em Casole d Elisa, por casualidade, conheci o mineiro Fernando de Almeida Neves, filho de Antonio de Almeida Neves, um dos irmãos do falecido presidente Tancredo de Almeida Neves. Ele resolveu aceitar o desafio de tocar uma pequena vinícola para 5 mil litros por ano, em Casole. Agora que a vinícola esta modernizada e pronta, a partir de setembro próximo vai passar 3 anos produzindo e ainda guardando o vinho em tonel de madeira, pois, Chianti, a vedete do vinho da uva Sangiovese, tem que ter este envelhecimento. Visitei varias outras que elaboram ate 150 mil litros fazendo degustação de vinhos básicos, clássicos e reservados, tanto brancos, como rosados e tintos. No geral, as vinícolas são modernas e competitivas. O Estado as protege, pois e um dos sucessos do agronegócio da Toscana. Pelas cidades se multiplicam os negócios que envolvem enotecas, espaços para vinho e gastronomia, atendendo clientes para lhes mostrar a maravilha de tantas especialidades, fazendo degustações e, sobretudo, vendendo o produto de um solo e de um clima absolutamente generosos.

(18) Muitos livros propagam as maravilhas da cozinha da Toscana, inclusive como a base da cozinha italiana. Embora tudo seja muito típico, ela não e rebuscada nem se pode dizer que seja sofisticada, como a cozinha francesa. A principal característica e a utilização de produtos agrícolas frescos e com forte apelo pelo saudável. Veja o caso indissociável do azeite de oliva e de muitas hortaliças e especiarias, as quais se juntam favas, nozes, e diversos produtos láticos, especialmente uma grande diversidade de queijos, e também embutidos como prosciuto e salumi. Uma das vedetes maiores e que forma a lista inevitável do primo piati e a grande diversidade de pasta, o velho macarrão, desde a sua forma mais clássica do spagheti a todas as variações de massas curtas. E a chamada cozinha inteligente que privilegia critérios de saudabilidade pouco encontrada pelo mundo. O pão típico toscano, por exemplo, e sem sal. Quando a base e carne, as opções incluem também caças como javali e faisão. Também se deve falar de maravilhosos pães e doces que esta cozinha produz, tudo isto com uma forte presença das frutas, dos cereais e do trigo durum do solo italiano. Por fim, não e demais reafirmar que um dos segredos da Toscana e a fertilidade de suas terras em vales de grande vitalidade, de onde também se pode dizer que, em se plantando tudo da. E do melhor. 
 (19) No ultimo dia em San Gimignano assistimos a um Festival que ocorre aqui anualmente e que retoma as tradições de cavaleiros medievais, suas artes (culinária, artesanato, musica, teatro, etc., e competições). Este ano, veio da Alemanha uma banda de musica que se apresentou com a execução marcial de cavalarias medievais. Belíssimo espetáculo que se houve por muitas horas do dia, indo terminar já pelas 23 horas na Praça da Catedral.


(20) Desde ontem deixamos San Gimignano para trás, chegando a Roma para mais uns dias de férias. Ficamos com a saudade daquele lugar pacato do mundo, onde quase não se ouvia barulho nas noites frias, a não ser um ou outro transeunte nas vielas, indo para casa. Ao chegar em Roma, o barulho e infernal. As pessoas falam muito alto aos telefones celulares, gritam porque se atrapalha o caminhar deles em qualquer via, como se fossem os donos de todo o território, atendem mal ao pedido de informação, e por ai. Mas, tirando isto, Roma e a cidade eterna, linda em quase tudo que se vê. Num rápido circuito pela área histórica, vê-se que mais escavações foram feitas e mais espaços para visitação publica. Da ultima vez que aqui estive não havia ainda o VLT agora circulando próximo do Coliseu. Agora o governo esta implantando a terceira linha do Metro. Hoje, espero ter uma nova oportunidade para percorrer a Via do Corso, onde fica o Albergo e a Basílica de San Carlo Borromeu, onde o Pe. Cicero voltou a celebrar missa, depois da sua suspensão. Parece que nisto eu reencontro parte da minha própria historia. Buona domenica per tutti.