sábado, 19 de dezembro de 2015


BOA TARDE
Dou continuidade à publicação nesta página das pequenas crônicas que estão sendo lidas no Jornal da Tarde (FM Rádio Padre Cícero, 104,9 de Juazeiro do Norte) nos dias de segundas, quartas e sextas feiras, sob o título Boa Tarde para Você.

209: (15.12.2015) Boa Tarde para Você, Nicanor Gonzaga Araruna
A minha curiosidade quase me levava na terça feira passada ao Romeirão para a santa missa, coordenada pela comunidade dos Filhos Amados do Céu e celebrada pelo padre Sebastião Monteiro, a quem se credita o grande fenômeno religioso destes últimos tempos no Cariri. Terminei por me contentar em ver alguns desses momentos através da televisão, segundo se diz – gentileza do empresário que assegura ao movimento o horário gratuito de 2 horas, ou mais, semanalmente, além de mais uma hora diariamente na tv, mais uma hora pela emissora de rádio. Em verdade, eu me enchi de medo, Nicanor, quando lembrei que o Romeirão é licenciado pela Federação Cearense de Futebol para apenas 10 mil ingressos, contraposto ao uso nestas circunstâncias de orações a coisa de 30 mil fiéis, entre arquibancadas e o campo gramado. Estimo, torço e rezo para que este movimento mais ainda cresça na fé de nosso povo e que esses instantes tocantes grassem e invadam o coração de todos, pois é notável que em dia como aquele, a praça de esportes se encha do Espírito Santo e uma grande graça recaia sobre todos. O que me preocupa, Nicanor, diante de algumas constatações, é que o Romeirão se tornou muito pequeno para eventos dessa natureza, onde a aglomeração de pessoas, livremente aceitas para ingresso, e por questões de segurança, fica sem alternativa de escape, se alguma necessidade se verificar, por pânico na multidão, em caso de uma retirada com emergência. Os estádios tem no campo a zona preferencial de fuga, mas no Romeirão nestes encontros, o gramado está tomado, e pode até comportar, facilmente, uns 15 mil ou mais expectadores que podem realizar uma compactação adicional sobre a grama de quase 200 quilos por metro quadrado. Ora, quando me fizeram estas ponderações fui perceber a gravidade destes fatos associados ao derramemento significativo de vela derretida que vai aos poucos impermeabilizando o terreno e prejudicando o aguamento, sem falar na demanda crescente de água em grama maltratada. Isso é bem diferente da situação ideal para o qual a praça foi construída, onde no seu interior, não mais existem regularmente mais de 50 pessoas que, quando muito, jogam água e suor na grama. Não faço aqui, Nicanor, o julgamento apressado do diabo, que apenas reclamaria dos custos que se elevam com água para a rega do gramado, da limpeza da área e da bateria de sanitários, sem falar dos custos adicionais por iluminação, etc, tudo nas graças do 0800 da municipalidade. Aliás, segundo soube, a municipalidade por algum critério não revelado, se posiciona por este prestígio e a tal ponto se confirma que é certo de que isto tem um custo/benefício de fácil absorção nas contas, até mesmo que isto seja realizado mais que um evento semanal. 
De qualquer modo, Nicanor, percebo em curso um redirecionamento para melhor localização do evento, a despeito que fatores importantes, como a centralidade do Romeirão e a questão do transporte para tantos que se dirigem ao Romeirão. Fatos como estes nos servem para considerar a conveniência de que é de bom alvitre a municipalidade se antecipar no planejamento necessário à ampliação de espaços urbanos dedicados ao que há de mais sagrado, qual seja a responsável utilização pública de suas áreas. Aí nada de novo se considerarmos que o grande movimento se iniciou com evento de rua, evoluiu para o uso do Ginásio Poliesportivo, chegou ao Romeirão e agora se encontra em vias de mudança. Nossa cidade já deve merecer a atenção para locais de grande aglomeração, algo que satisfaça a realização de grandes eventos sociais em campo aberto, para maior comodidade e praticidade. Nesse instante, superados os espaços de Shopping, Ginásio Esportivo, Basílica, etc. parece razoável investir no Parque da Vaquejada, não obstante a situação geográfica e dos demais inconvenientes que são flagrantes na rusticidade do equipamento. Convém lembrar que o Centro de Apoio ao Romeiro tem inacabada uma área privilegiada para eventos e seria razoável provocar a responsabilidade para a complementação da sua estrutura. Dentro em breve vão começar os jogos pelos diversos campeonatos, e ao meu sentimento isto vai terminar com o encerramento deste uso do Romeirão, pois o calendário pode assinalar dois ou mais jogos na semana, dificultando o destino para outros acontecimentos, em razão da manutenção. É, Nicanor, entendo a sua angústia e faço votos para em tudo você se resolva muito bem.

(Crônica lida durante o Jornal da Tarde, da FM Padre Cícero, Juazeiro do Norte, em 15.12.2014) 
O CINEMA ALTERNATIVO NO CARIRI
Neste período de festas Natalinas e Ano Novo o circuito alternativo de cinema do Cariri entra em recesso. No dia 5 de janeiro deverá ser divulgada a nova programação.
CINE ELDORADO (JN)
O Cine Eldorado (Cantina Zé Ferreira, Rua Padre Cícero, Juazeiro do Norte), com entrada gratuita e com a curadoria e mediação do prof. Edmilson Martins, exibe no próximo dia 25, sexta feira, às 20 horas, o filme UMA HISTÓRIA DE NATAL. Direção de Juha Wuolijoki. Sinópse: Em uma remota aldeia na Lapónia, o jovem Nikolas perde sua família em um acidente e é adotado pelos moradores. Todo ano no dia de Natal, Nikolas tem que mudar para uma casa nova. Para mostrar sua gratidão, Nikolas faz brinquedos para as crianças das famílias, como presente de despedida. Ao longo dos anos, torna-se muito amigo das suas ex-famílias adotivas e coloca em todas as casas da aldeia um presente nossa porta, na manhã de Natal. Quando os moradores sofrem escassez de alimentos, os moradores têm que enviar Nikolas para trabalhar com o aprendiz do carpinteiro eremita Lisakki. Sob sua tutela severa, Nikolas desenvolve habilidades que lhe permitem a criar presentes ainda melhor, e trabalhar ainda mais rápido. Mas Iisaki que odeia crianças, proíbe Nikolas a fazer presentes de Natal, tradição que parece prestes a desaparecer.

UTILIDADE PÚBLICA
Mais uma instituição eclesiástica é reconhecida de utilidade pública em Juazeiro do Norte, por este ato que solidariamente assinam a Câmara e a Municipalidade. Ela nasceu em setembro passado e já é reconhecida de utilidade pública. Não foi informado o endereço onde a Igreja está desempenhando as suas funções preconizadas no reconhecimento. 

Eis o ato publicado no Diário Oficial:
LEI Nº 4562, DE 07 DE DEZEMBRO DE 2015 Reconhece de utilidade pública a IGREJA PENTECOSTAL RESGATADOS PELA GRAÇA e adota outras providências. O PREFEITO DO MUNICÍPIO DE JUAZEIRO DO NORTE, Estado do Ceará. FAÇO SABER que a CÂMARA MUNICIPAL decretou e eu sanciono e promulgo a seguinte Lei: Art. 1º – Fica reconhecida de utilidade pública a IGREJA PENTECOSTAL RESGATADOS PELA GRAÇA, fundada em 07 de setembro de 2015 como entidade religiosa, sem fins econômicos, de caráter filantrópico e credo religioso, com duração por tempo indeterminado, com sede e foro no Município de Juazeiro do Norte, Estado do Ceará, regendo-se por seu seus estatutos sociais, bem como pelas leis, usos e costumes nacionais. Art. 2º – Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário. Palácio Municipal José Geraldo da Cruz, em Juazeiro do Norte, Estado do Ceará, aos 07 (sete) de dezembro de 2015 (dois mil e quinze). DR. Raimundo Macedo, Prefeito; Autoria: Cláudio Sergei Luz e Silva; Subscrição: Cícero Claudionor Lima Mota

CIDADANIA JUAZEIRENSE
Novos juazeirenses são reconhecidos pela Câmara Municipal de Juazeiro do Norte, para mais enriquecer o seu patrimônio cidadão. Vejamos os atos: 
RESOLUÇÃO N.º 802, de 08.12.2015: Art. 1.º - Fica concedido o Título Honorífico de Cidadã Juazeirense a Senhora ANDREA MAIA LANDIM, pelos inestimáveis serviços prestados a comunidade juazeirense. Autoria: Cláudio Sergei Luz e Silva; Coautoria: José Tarso Magno Teixeira da Silva e João Alberto Morais Borges; Subscrição: José Adauto Araújo Ramos, Antônio Cledmilson Vieira Pinheiro, Pedro Bertrand Alencar Montezuma Rocha, José Nivaldo Cabral de Moura, Normando Sóracles Gonçalves Damascena, Cícero Claudionor Lima Mota, José Ivan Beijamim de Moura, Firmino Neto Calu e pelas Vereadoras Auricélia Bezerra, Maria Calisto de Brito Pequeno e Rita de Cássia Monteiro Gomes. 

RESOLUÇÃO N.º 803, de 08.12.2015: Art. 1.º - Fica concedido o Título Honorífico de Cidadão Juazeirense ao Ilustre Senhor GEORGES AUBERT DOS SANTOS FREITAS, pelos inestimáveis serviços prestados a comunidade juazeirense. Autoria: Antônio Vieira Neto; Coautoria: Glêdson Lima Bezerra; Subscrição: José Adauto Araújo Ramos, Antônio Cledmilson Vieira Pinheiro, Pedro Bertrand Alencar Montezuma Rocha, José Nivaldo Cabral de Moura, Normando Sóracles Gonçalves Damascena, Cícero Claudionor Lima Mota, José Tarso Magno Teixeira da Silva, José Ivan Beijamim de Moura, Francisco Alberto da Costa, Paulo José de Macêdo e pelas Vereadoras Auricélia Bezerra, Maria de Fátima Ferreira Torres e Rita de Cássia Monteiro Gomes. 

RESOLUÇÃO N.º 804, de 08.12.2015: Art. 1.º - Fica concedido o Título Honorífico de Cidadão Juazeirense ao Ilustre Senhor CÍCERO NELSON CORDEIRO DE BRITO, pelos relevantes serviços prestados a comunidade juazeirense. Autoria: Antônio Vieira Neto; Coautoria: Glêdson Lima Bezerra, Rubens Darlan de Morais Lobo e Firmino Neto Calú; Subscrição: José Adauto Araújo Ramos, Antônio Cledmilson Vieira Pinheiro, Pedro Bertrand Alencar Montezuma Rocha, José Tarso Magno Teixeira da Silva, José Nivaldo Cabral de Moura, Normando Sóracles Gonçalves Damascena, Cícero Claudionor Lima Mota, José Ivan Beijamim de Moura, Francisco Alberto da Costa, Paulo José de Macêdo e pelas Vereadoras Auricélia Bezerra, Maria de Fátima Ferreira Torres e Rita de Cássia Monteiro Gomes. 

RESOLUÇÃO N.º 805, de 08.12.2015: Art. 1.º - Fica concedido o Título Honorífico de Cidadão Juazeirense ao Ilustre Senhor VICENTE FÁBIO CARNEIRO DA SILVA, pelos relevantes serviços prestados a comunidade juazeirense. Autoria: José Adauto Araújo Ramos; Coautoria: Glêdson Lima Bezerra, Normando Sóracles Gonçalves Damascena, Antônio Cledmilson Vieira Pinheiro e João Alberto Morais Borges; Subscrição: Pedro Bertrand Alencar Montezuma Rocha, José Tarso Magno Teixeira da Silva, José Nivaldo Cabral de Moura, Cícero Claudionor Lima Mota, José Ivan Beijamim de Moura, Paulo José de Macêdo, Antônio Vieira Neto e pela Vereadora Auricélia Bezerra. 

RESOLUÇÃO N.º 806, de 08.12.2015: Art. 1.º - Fica concedido o Título Honorífico de Cidadão Juazeirense ao Ilustre Senhor JÚLIO EMILIO LOSSIO DE MACÊDO, pelos relevantes serviços prestados a comunidade juazeirense. Autoria: Firmino Neto Calú; Coautoria: Danty Bezerra Silva; Subscrição: Pedro Bertrand Alencar Montezuma Rocha, José Tarso Magno Teixeira da Silva, José Nivaldo Cabral de Moura, Cícero Claudionor Lima Mota, José Ivan Beijamim de Moura, Paulo José de Macêdo, Antônio Vieira Neto, João Alberto Morais Borges, Glêdson Lima Bezerra, Antônio Cledmilson Vieira Pinheiro, Rubens Darlan de Morais Lobo, Francisco Alberto da Costa e pelas Vereadoras Auricélia Bezerra, Maria de Fátima Ferreira Torres, Maria Calisto de Brito Pequeno e Rita de Cássia Monteiro Gomes.
MAURO SAMPAIO, UMA LENDA
Transcrevo com grande simpatia a homenagem que Humberto Mendonça fez, inicialmente através do Diário do Nordeste (versão simplificada pelo editor, na edição de 13.12, pp) e que foi também reproduzida (forma completa) no Jornal do Cariri (edição de 15.12, pp). Sou solidário ao belo perfil que Humberto traça de Dr. Mauro.
Com a morte de Mauro Sampaio, o Cariri fica mais pobre. Vou falar sobre um homem que conheci e privei de sua amizade. Desde que chegou a Juazeiro do Norte, no início da década de 50, só me lembro de Mauro e Dayse, sua mulher, morando na Rua Santa Rosa, 207, nas proximidades da Igreja do Socorro. Eles foram vizinhos, a vida toda, de José Camilo e dona Heloísa, a família de Expedito Cornélio, meus pais, Auríno Mendonça e dona Maria Luíza, Souzinha e Mariinha, José Gomes e Maria Elza, Coelho Alves e dona Rosa, Antônio Geremias e família e Burica e Aurina. Eram de uma simplicidade fora do comum! Mauro Sampaio foi o grande prefeito de Juazeiro do Norte por dois mandatos e, em cinco vezes, deputado federal, sucedendo seu genitor Dr. Leão Sampaio, deputado federal por 11 legislaturas. Durante essa trajetória, nunca saiu da modesta casa, apesar de que poderia, como tantos outros, ter construído mansões na Lagoa Seca, bairro elegante de Juazeiro. Como médico, foi um verdadeiro sacerdote, receitando e operando de graça durante a vida toda – e não se cansava. Salvou muitas vidas. Ele não tinha hora para exercer a sua medicina, nde o dinheiro foi sempre secundário. Como político, foi sempre o mesmo. Dinheiro era secundário. Morreu pobre, como viveu fransciscanamente. É pena que os seus sucessores no serviço público, que pegaram carona na sua história e administração, não tenham seguido as suas pegadas em termos de honestidade. Enveredaram pela corrupção que hoje permeia Juazeiro e, por que não dizer, quase todo Cariri. Mauro Sampaio deu enorme contribuição a Juazeiro, no começo de sua vida pública. Em 1962, era candidato a prefeito, quando surgiu uma outra candidatura: a de Humberto Bezerra. Nós, da UDN e do Juazeiro, precisávamos derrotar o candidato Dr. Conserva Feitosa, do PSD. Formei uma comissão com José Machado e Gumercindo Ferreira e fomos fazer um apelo a Mauro, para que abrisse mão de sua candidatura, naquele momento difícil, em favor de Humberto. Ele seria o próximo candidato da UDN. Mauro, com todo desprendimento, acatou o pedido prontamente. De fato, ele foi o sucessor de Humberto nas eleições de 1966. Humberto inaugurou uma nova fase de realizações na cidade. Mauro seguiu a mesma política desenvolvimentista, com destaques para a Estátua do Horto, o Estádio Romeirão e a rede de educação e saúde, e contribuiu para a vinda da Faculdade de Medicina de Juazeiro. Depois de muitos anos, já residindo no Crato, nos anos 70, recebo a visita de Mauro Sampaio e Doro Germano, em nome do prefeito Pedro Felício Cavalcante, me convidando para ser candidato a deputado estadual, numa dobradinha com ele, então candidato a deputado federal. Meu sogro, Antônio Alves, muito amigo de Pedro Felício, ainda era vivo. Nós estávamos no auge da crise do algodão, chegando à conclusão de que, naquele momento, a minha candidatura era inviável. Hoje, vejo Mauro morrer pobre de dinheiro, mas rico de bondade e honestidade, deixando muita saudade e o exemplo de uma vida digna. Quem não foi capaz de seguir seus exemplos até aqui, que as novas gerações o sigam para o bem da região e do seu povo. (Jornal do Cariri, 15.12.2015)
PADRE MURILO (Por Geová Sobreira)
Originalmente publicado no portal Juanorte, estamos republicando a série de artigos escritos por Geová Sobreira, pela oportunidade da memória dos 10 anos do falecimento do inesquecível Vigário do Nordeste, cumprimentando-o pela excelência de seu depoimento. 

PADRE MURILO (I)
No dia 31 de outubro de 1930, na cidade de Barbalha, nascia uma saudável criança que na pia batismal na igreja matriz de Santo Antonio recebia o nome de Francisco Murilo de Sá Barreto, filho de José Pácifer de Sá Barreto e de Laudelina Correia de Sá Barreto. O Brasil, naqueles dias de outubro de 1930, vivia horas de grandes incertezas e de intensas inquietações sociais e políticas com a vitória da Revolução Tenentista, com o líder revolucionário, Getúlio Vargas, assumindo a Presidência da República e os primeiros atos do Governo Revolucionário foi destituir todos os governadores e prefeitos de todos os estados e municípios da Federação. O Ceará, mais especificamente o Cariri Cearense, foi definido com área problema da Federação Brasileira, devido não aos problemas das secas, mas em razão das atividades de grupos de cangaceiros que infestavam e atormentavam todas as populações do Nordeste. Isso era devido as tríplices fronteiras: Ceará, Paraíba e Pernambuco, dificultando o combate ao cangaço pelas “volantes” das Polícias estaduais. Os grupos de Lampião, de Chico Pereira e de Luís Padre eram acoitados na região do Cariri por seus chefes políticos. Além disso, eram do conhecimento geral e divulgado pela grande imprensa do país, inclusive com fotos publicadas no jornal O Globo, do Rio de Janeiro, que muitos familiares de Lampião, inclusive uma sua irmã, viviam tranquilamente em Juazeiro, sob a proteção do Padre Cícero. Este fato justificou envio do Batalhão 44, do IV Exército, sediado em Recife, para o Cariri com o objetivo de desarmar os “coronéis” da região acusado de acoitar cangaceiros. Não ocorreram atos violentos nem atrabiliários praticados pelos tenentes, mas provocaram muitas tensões com a destituição de todos os prefeitos da região. No entanto, um dos fatos mais marcantes e que tiveram profunda influência na formação da juventude cearense na década de 1930, foi a projeção a nível nacional de uma elite de intelectuais católicos liderada pelo Padre Helder Câmara, por Severino Sombra, Jeová Mota, Menezes Pimentel, que em caravana percorreram todos os municípios do Ceará propagando as ideias da Liga Eleitoral Católica. Talvez, tenha sido essa a razão que induziu muitos jovens de talento do Ceará, em busca de afirmação pessoal e projeção social, a procurarem as Escolas Militares de formação de oficiais e os Seminários Católicos. Barbalha era uma das cidades da região do Cariri que cultivava com esmero as mais sólidas tradições católicas, guardando ainda vivas e palpitantes as lições do Padre Mestre Ibiapina. A Casa de Caridade de Barbalha, fundada por Pedro Lobo de Menezes, pai do Padre Azarias Sobreira, além de formar mais de quatro gerações de jovens católicas, exerceu profunda influência na vida social e intelectual da cidade que se orgulhava e se orgulha ainda de ter sido a terceira cidade brasileira a criar o “clube do livro” nos moldes do Gabinete Português de Leitura fundado ainda por Dom João VI na cidade do Rio de Janeiro. Foi desse ambiente de fortes tradições católicas e intelectuais que fez nascer no jovem Francisco Murilo de Sá Barreto motivações para manifestar pendores e desejos de seguir a carreira eclesiástica e assim, em 1945, com quinze anos incompletos ele ingressou no Seminário Diocesano do Crato, que vivia talvez o seu momento mais importante de sua história, com um corpo docente da mais alta formação intelectual, bebida ainda quando o Padre Azarias Sobreira fora reitor do Seminário do Crato. Era uma constelação de escol intelectual: Monsenhor Montenegro, Padre Davi, Padre Antonio Gomes, Padre Agra... Iniciava-se a trajetória da formação moral, intelectual, cívica, teológica e eclesiástica do jovem Francisco Murilo de Sá Barreto que se alçaria no futuro com uma das mais altas expressões da Igreja Católica do Brasil no século XX. No dia do seu aniversário, Juazeiro em uníssona voz cantará, sentindo imensa saudade, PARABÉNS PADRE MURILO!
PADRE MURILO (II)

Em 15 de dezembro de 1957, em solene cerimônia presidida por Dom Francisco de Assis Pires, bispo diocesano do Crato, o jovem Francisco Murilo de Sá Barreto recebeu as ordens sacras sacerdotais. Em janeiro de 1958, ele foi nomeado vigário- auxiliar da Paróquia Nossa Senhora das Dores, sendo, então, vigário em Juazeiro o Mons. José Alves de Lima. Eram imensos os desafios pastorais para o jovem levita porque desde 1930 vinham se avolumando as tensões entre a diocese do Crato e o movimento religioso popular de Juazeiro, quando, o então vigário de Juazeiro, Mons. José Alves de Lima determinou a violação do túmulo, na Capela do Socorro, onde havia sido sepultada a Beata Maria de Araújo. Diante das enormes reações negativas de toda a população de Juazeiro a esse violento desrespeito a uma sepultura cristã, o novo bispo da Diocese do Crato, Dom Francisco de Assis Pires, é aconselhado pelo Cardeal do Rio de Janeiro, Dom Sebastião Leme, a transferir Mons. José Alves de Lima para outras dioceses no sul do país. Mons. José Alves de Lima permaneceu em diversas regiões do Estado do Espírito Santo, quando retornou ao Cariri como vigário da cidade de Icó. Para substituir Mons. Lima como vigário da Paróquia de Nossa Senhora das Dores, Dom Francisco de Assis Pires nomeou o Mons. Pedro Esmeraldo, que foi recebido com muito carinho e efusiva alegria por toda a população de Juazeiro. Foi ele quem ministrou os últimos sacramentos ao Padre Cícero e ajudou a vestir seus paramentos sacerdotais para que o Padim dos Romeiros fosse sepultado como sacerdote. No entanto, celebrando a Santa Missa no dia 31 de outubro de 1934, o Mons. Esmeraldo, com grandes rasgos inflamados de retórica, prega um confuso e emotivo sermão, que é entendido pelo povo que hordas de infiéis viriam invadir a Matriz da Mãe de Deus e sequestrar a imagem de Nossa Senhora das Dores entronizada do Altar-Mor da igreja. Depois da celebração, Mons. Esmeraldo dirige-se à sacristia e, após tirar os sagrados paramentos sofre um enfarto fulminante e morre. Houve um frêmito em Juazeiro e a cidade ficou em comoção supondo que infiéis viessem violar a Casa da Mãe de Deus e retirar a querida imagem de Nossa Senhora das Dores. Populares cercaram a igreja, armados e paus e cacetes, para não permitir a violação da igreja de Nossa Senhora das Dores, construída pelo Padre Cícero. As autoridades tentaram em vão negociar com os “caceteiros” a desocupação da Matriz. Não houve acordo e se deu a trágica e impensada intervenção policial, comandada pelo Sargento Mena Barreto. O conflito foi feroz sendo registrados 6 óbitos e 18 feridos à bala, ficando todas as paredes da igreja salpicadas de sangue. Juazeiro ficou mais uma vez sem vigário e o bispo da diocese do Crato teve enormes dificuldades de preencher o vicariato da igreja Matriz de Nossa Senhora, apesar das constantes solicitações das autoridades locais e de todos os católicos, porque o clero diocesano resistia assumir aquela função em razão das sequelas nascidas na gestão do Mons. Lima e dos últimos acontecimentos de violência envolvendo os “caceteiros” e o batalhão policial de Juazeiro. Em 1935, Dom Francisco de Assis Pires teve que abrir mão de seu mais importante e assíduo conselheiro, Mons. Joviano Barreto, culto, eloquente, diplomático e incansável trabalhador nomeando vigário de Juazeiro. Era árdua e difícil a missão do Mons. Joviano Barreto para reconquistar da confiança do povo e ele procurou integrar-se por completo à sociedade de Juazeiro, revitalizando as Congregações e Irmandades religiosas, dando aulas na Escola Normal e participando ativamente da vida social da cidade. Logo após a sua posse, como vigário, retomou com objetividade as negociações para a vinda da Congregação Salesiana e logo em seguida principiou as tratativas para a vinda dos frades capuchinhos para construção de um santuário e um seminário religioso em Juazeiro. No entanto, uma nova tragédia veio abater-se sobre o Juazeiro: um desequilibrado mental, Manoel Pedro da Silva, em suas tresloucadas alucinações pedia, usando terríveis ameaças, que o vigário de Juazeiro oficiasse o seu casamento religioso com uma senhora, já casada, membro da mais alta sociedade da cidade. Depois de frustradas tentativas do cometimento do crime, no dia solene do lançamento da pedra fundamental do Santuário Franciscano, no dia 06 de janeiro de l950, o demente Manoel Pedro da Silva mistura-se furtivamente no meio da multidão festiva e, aproximando-se sorrateiramente do Mons. Joviano Barreto, desfecha uma punhalada fatal no coração do vigário de Juazeiro. Essa terrível tragédia maculou a história religiosa de Juazeiro. Juazeiro estava novamente sem vigário. Os padres da diocese do Crato não sentiam a menor inclinação em aceitar a espinhosa e delicada missão de ser vigário em Juazeiro. Dom Francisco de Assis Pires angustiava-se com a situação de a maior paróquia de sua diocese ficar sem um pastor, quando de repente veio-lhe a surpresa. Mons. José Alves de Lima, que havia retornado do sul do país depois de 15 anos de ausência da região, apresenta-se humildemente ao diocesano oferecendo-se ao sacrifício de assumir a Paróquia de Nossa Senhora das Dores. E veio em 1950. Com prudência e muito tato foi reconquistando pouco a pouco o apoio das irmandades religiosas e cativando os católicos com o seu humor inteligente e encantador. No entanto, já estava velho e cansado, com problemas de saúde em razão da obesidade mórbida. E a cruz era pesada e ele precisava de um Cirineu. Em janeiro de 1958, o jovem levita, recém-ordenado, Padre Francisco Murilo de Sá Barreto é escolhido por Dom Francisco de Assis Pires como vigário auxiliar do Mons. José Alves de Lima da Paróquia de Nossa Senhora das Dores. O jovem chega a Juazeiro cheio de sonhos e principia uma trajetória fulgurante que se projetará sobre todo o nordeste brasileiro.
PADRE MURILO (III)

Para se entender a história recente do Cariri Cearense na década de 1950 é preciso se deter numa profunda análise do panorama global da região. No final da década de 1940, a cidade do Crato concluiu diversas e importantes obras de sua infraestrutura urbana. Com o produto da venda de bens doados pelo Padre Cícero, em Escritura Pública datada de fevereiro de 1934, Dom Francisco de Assis Pires, bispo do Crato, realizou a transformação da fisionomia da cidade: construção do Palácio Episcopal, o Hospital São Francisco, reforma no Ginásio Diocesano do Crato e do Colégio Santa Tereza, construção do conjunto arquitetônico onde seriam instalados o Cine Educadora, a Rádio Educadora e a Faculdade de Filosofia do Crato, que seria a semente de uma futura Universidade Católica, além de uma Empresa Gráfica e a modernização do jornal A Ação. Ao lado desses importantes equipamentos urbanos promotores da modernização da cidade a elite política da região era cratense, liderada pelo senador Wilson Gonçalves e pelo deputado federal Osian Alencar Araripe. Um grupo de intelectuais, entre os quais J. Figueiredo Filho e Denizar Macedo articulavam a criação de uma revista, a Itaytera, para a divulgação das glórias da Princesa do Cariri. Às vésperas da celebração do Primeiro Centenário do Crato foram criados dois slogans que deveriam marcar a história da cidade: “ Crato, Capital da Cultura” e “só no Crato”, querendo indicar que tudo o que existe de bom, de culto, de refinado só existia na cidade do Crato, além de marcar a distinção de excelência das coisas e da população de outras cidades da região, de modo especial de Juazeiro, que era objeto de chacota como cidade de beatos, fanáticos e romeiros analfabetos. Na euforia do Primeiro Centenário do Crato, alguns intelectuais retomaram o velho diapasão “delenda Juazeiro” e um dos primeiros movimentos foi a infeliz entrevista com o Dr. Raul de Carvalho, em 1953, a um grande jornal de Fortaleza relatando equivocadamente fatos relacionados com o espólio do Prof. José Marrocos, ocorridos em 1910 e invocando com testemunhas para a pretensa veracidade de seu relato pessoas que há muitos anos falecidas. O objetivo era atingir o Padre Cícero inventando um encontro, em 1910, entre o Cel. Antonio Luís e o Padre Cícero com o objetivo de devolver uma pequena urna com “paninhos ensanguentados” recolhidos nos momentos em ocorria a comunhão da beata Maria de Araújo e a hóstia transformava-se em sangue vivo. O professor José Marrocos guardava com profunda devoção aqueles “paninhos” em sua residência no Crato. No dia da morte de Marrocos, Raul de Carvalho, respondendo pelo juizado do Crato, ordenou que a polícia fosse à casa do falecido e recolhesse tudo o que lá se encontrasse. Dr. Raul de Carvalho se apropriou dos bens apesar dos vibrantes editoriais do jornal O Rebate acusando-o de prevaricação. Não tinham ainda adormecidas as reações do povo do Juazeiro com tais calúnias, o Padre Antonio Gomes vem à ribalta com um opúsculo – Um Civilizador do Cariri – um estudo sobre Basílio Gomes da Silva, seu progenitor, mas descamba para atacar a figura de José Marrocos. Não satisfeito, em 1955, o Padre Antonio Gomes publicou “O Apostolado do Embuste” , acusando que os fatos maravilhosos com a beata Maria de Araújo eram maquinações químicas utilizada pelo professor José Marrocos. E mais, aquele autor, impando de confiança em si mesmo, querendo triunfar pelo terror e pela audácia de atitudes partiu para o ataque acusando Pedro Lobo de Menezes, pai do Padre Azarias Sobreira, de “fascinado na crença das drogas marroquinas”. Diante de tantas diatribes, o Padre Azarias publicou, em Fortaleza, o Em Defesa de Um Abolicionista refutando todas as acusações feitas ao professor José Marrocos, um dos vultos na história do jornalismo no Estado do Ceará e personagem mais marcante na história da abolição da escravidão africana no Brasil. Rebate, também, as injúrias dirigidas ao seu pai. Ficavam cada vez mais tensas as relações da população de Juazeiro com as autoridades eclesiásticas da Diocese do Crato e, neste ponto, o Arcebispo do Ceará, Dom Antonio de Almeida Lustosa resolveu intervir impondo silêncio obsequioso sobre o movimento religioso popular de Juazeiro. Foi neste clima tenso dentro da Diocese do Crato que o jovem, Francisco Murilo de Sá Barreto, recém-ordenado sacerdote é nomeado, em janeiro de 1958, vigário auxiliar da Paróquia Nossa Senhora das Dores.
PADRE MURILO (IV)
Para entender a década de 1950 na região do Cariri o pesquisador e o cientista social necessitam estender por diversas áreas do tecido social os seus focos de observação para compreender o agravamento das tensões entre Crato e Juazeiro que estavam se agravando de uma maneira realmente assustadora. Havia preocupações de que a consolidação do parque industrial de Juazeiro, além da conquista do mercado regional pelo empório comercial da Terra do Padre Cícero com uma área de influência de mais de 150 km ameaçassem a hegemonia das atividades comerciais do Crato. Outra preocupação concreta residia nos receios de o Crato perder sua influência no campo de educação já que os três mais importantes centros educacionais da região eram de propriedade da Diocese: Ginásio Santa Tereza, Colégio Diocesano e Faculdade de Filosofia, em época em implantação. O observador dos fatos históricos do Cariri Cearense não compreende porque, no início da década de 1950, a Diocese do Crato não deu largos passos para promover a harmonia na região, após a tragédia da morte do Mons. Joviniano Barreto, num ato tresloucado de um mentecapto residente em Juazeiro. A Diocese dispunha de diversos sacerdotes, entre o seu clero, aptos a assumir o vicariato de Juazeiro: Padre Cícero Coutinho, Padre Silvino Moreira, Padre Jesu Flor, Padre Azarias Sobreira, Padre Orlando Tavares, Padre José Gonçalves Dias Sobreira, Padre Vicente Feitosa, Padre Waldir Sobreira. Mas, não! A diocese nomeou para o cargo de vigário de Juazeiro o Mons. José Alves de Lima, autor intelectual e mandante da violação do túmulo da Beata Maria de Araújo. Mons. Lima evitava qualquer contato por mais simples que fosse com o povo romeiro. Assim, era natural que a população de Juazeiro fosse se afastando dos atos oficiais da Paróquia Nossa Senhora das Dores e crescessem as práticas do movimento religioso popular do mais importante a mais profunda e sistema explosão de sincretismo religioso. Por outro lado, a Diocese do Crato dependia quase totalmente das esmolas dos romeiros para custear as suas despesas correntes. Essa tensão estava se generalizando. Era rara a ocasião em que uma simples partida de futebol entre os times de Juazeiro e do Crato, quer fosse realizada em Crato ou em Juazeiro, que não terminasse em briga. Houve um evento típico caracterizando essas tensões: uma banal eleição de Miss Ceará. Entre as finalistas estavam uma garota representando Juazeiro e outra representando o Crato. Houve uma aguerrida batalha, que quase descambava para uma guerra. Salpicavam insultos de ambos os lados e enxurrada de sátiras políticas e de injúrias. Certo dia houve uma chuva de boletim na cidade do Crato em que se liam versos insultuosos, mal feitos, de rima pobre e de pé-quebrado, cujo autor se escondia em fluído anonimato covarde com o pseudônimo de “Zé-Povinho” com baixas ofensas em linguajar chulo contra toda a população de Juazeiro:

“SE JUAZEIRO...
Se estátua fosse tanque
E muriçoca avião
Se “corno” fosse soldado
E chifre munição
Juazeiro estava preparado
P’ra defender a Nação.

Mozart Cardoso de Alencar, barbalhense, radicado em Juazeiro, médico, político, poeta, bom tribuno e polemista saiu de peito aberto respondendo aos desaforos em boletim intitulado “Crato, quem foste e quem és...” composto de longo poema e um quase manifesto e proclama: “De hoje em diante não suportaremos mais pacificamente, como vínhamos, as difamações contra a nossa honra de povo humilde, pacato e laborioso”. Realmente, não eram animadoras as perspectivas para o jovem sacerdote, Padre Francisco Murilo de Sá Barreto, recém-saído do seminário, como vigário auxiliar de Juazeiro. 

PADRE MURILO (V)
Há um vasto campo de reflexão a respeito da nomeação do jovem, recém-ordenado sacerdote, Francisco Murilo de Sá Barreto como vigário auxiliar da Paróquia de Nossa Senhora das Dores, considerando que tradicionalmente a Diocese do Crato nomeava para aquelas funções sacerdotes, quase sempre Monsenhores, com profundas ligações com as tradições da diocese que mantinha posição radicalmente contrária ao movimento popular religioso de Juazeiro, tido com fanático. Antes tinha se registrado uma única exceção que foi a nomeação do Padre Manuel Macedo, muito culto, de inteligência brilhantíssima, excelente orador sacro, doutor em Direito Romano pela Universidade Gregoriana de Roma, juazeirense, filho de um dos amigos mais leais e próximo do Padre Cícero, Senhor Pelúsio Macedo. O Padre Manuel Macedo foi orientado por Dom Quintino a adotar hábitos iguais ao do Padre Cícero, o uso de cajado e do chapéu eclesiástico iguais ao que o Patriarca de Juazeiro usava. O objetivo da designação do Padre Manuel Macedo para a Paróquia de Nossa Senhora das Dores era conquistar o lugar e a influência que o Padre Cícero ocupava junto à população simples e humilde de Juazeiro e principalmente conter a vertiginosa liderança política de Floro Bartolomeu da Costa. No entanto, essa tática revelou-se um estupendo fracasso desaguando numa triste polêmica e que da parte do Padre Manuel Macedo resultou num pequeno opúsculo, “Joazeiro em Fóco”, editado pela arquidiocese do Ceará, pela “Empresa Editora de Autores Católicos” de Fortaleza. Depois desse lamentável episódio, a Diocese do Crato passou a prover a Paróquia de Nossa Senhora das Dores com sacerdotes experimentados e críticos acerbos ao movimento religioso popular de Juazeiro. Diante disso, merece uma reflexão mais ampla e circunstanciada a indicação do jovem sacerdote, Padre Murilo, para as funções de vigário auxiliar de Juazeiro. Acredita-se que a sociedade barbalhense teve sempre uma posição de certo distanciamento do movimento religioso popular de Juazeiro e de modo especial a memória de ressentimentos nascidos na Guerra de 1914, quando as tropas romeiras invadiram a cidade de Barbalha praticando algumas estripulias e provavelmente ocorrendo até saques. Acrescente-se a esse dado da vida social o fato que desde o início da Questão Religiosa duas figuras proeminentes da sociedade barbalhense, daquela época, o Padre Manoel Cândido dos Santos, vigário, e o Dr. João Firmino de Hollanda, Juiz de Direito foram acerbos críticos e adversários contumazes e obstinados dos “fatos maravilhosos de Juazeiro”, exercendo suas posições, portanto, grande influência em toda a comunidade católica de Barbalha. Além dessa influência dos círculos católicos de sua cidade natal, plena de reservas ao movimento religioso popular de Juazeiro, o jovem Francisco Murilo quando ingressou no Seminário Menor São José da Diocese do Crato encontrou uma ambiente hostil a tudo a que se referia a Juazeiro e ao Padre Cícero e as críticas , caindo até para zombarias grosseiras, eram sempre corriqueiras e os humildes e simples romeiros eram taxados de jagunços e fanáticos. Não foi diferente o ambiente que o jovem estudante de teologia encontrou no Seminário Maior da Prainha, em Fortaleza. Grande parcela da intelectualidade de Fortaleza divulgava que se estava concluindo pesquisas e estudos para provar as artimanhas matreiras do professor José Marrocos e provar que “os fatos” de Juazeiro eram um embuste. O próprio arcebispo de Fortaleza, na época da formação teológica do jovem Francisco Murilo, Dom Antonio de Almeida Lustosa mantinha posição contrária às romarias de Juazeiro. Não há registro de visita pastoral de Dom Lustosa à Diocese do Crato e isso tinha como razão de ser evitar contato com o humilde povo romeiro devoto do Padre Cícero. A principal obra literária de Dom Lustosa, Notas a Lápis, que versa sobre a cultura popular do sertanejo cearense e narra suas viagens pastorais silencia completamente sobre o Cariri e a mais densa população católica do Estado do Ceará. Na época da formação do jovem Francisco Murilo, quer no Seminário Menor no Crato quer no Seminário Arquidiocesano da Prainha, em Fortaleza, o ambiente cultural era radicalmente contrário ao movimento religioso popular de Juazeiro e, ainda, num cenário mais vasto, a elite urbana e culta do litoral sentia prazer em achincalhar a memória do Padre Cícero e ridicularizar o povo romeiro, como bem define o título do mais divulgado trabalho do escritor Abelardo Montenegro Fanáticos e Cangaceiros.
PADRE MURILO (VI)
Não foram somente as “irmandades e confrarias religiosas”, mas toda a sociedade de Juazeiro, que receberam com intenso regozijo, alegria e festas a chegada do jovem levita, Padre Francisco Murilo de Sá Barreto, como vigário auxiliar da Paróquia de Nossa Senhora das Dores, fulcro, base e coração de todo o movimento religioso popular da Terra da Mãe Deus. O vigário titular, Mons. José Alves de Lima, não tinha a menor simpatia com o constante fluxo de romarias e, talvez, pelo peso dos anos, levava burocraticamente a administração sem qualquer entusiasmo. As festas religiosas, como o mês mariano, o Natal, as procissões e a festa da padroeira da cidade, Nossa Senhora das Dores, eram organizadas pelas irmandades e confrarias religiosas com o envolvimento de toda a população da cidade, quer preparando os carros-andores das procissões, com arranjos e enfeites artisticamente bem elaborados, a banda de música para animar as noitadas, as quermesses e leilões festivos com prendas oferecidas pela população para as novenas da padroeira. As novenas solenes da Festa da Padroeira de Juazeiro eram um momento singular na vida da cidade com a participação de sociedade e das levas de romeiros que vinham cantar os louvores à Nossa Senhora das Dores, culminando com a rica e solene procissão... Todos os eventos da cidade eram um palmilhar tranquilo na trajetória de sucesso da terra do Patriarca de Juazeiro... No início do ministério sacerdotal do jovem levita, Francisco Murilo de Sá Barreto teve o apoio da “colônia” da Barbalha, radicada em Juazeiro, ocupando posição de grande relevo na área comercial, industrial e na vida política de Juazeiro, sendo figuras de maior destaque: Antonio Correio Celestino, José Feijó de Sá Barreto, Pedro Sampaio, Senhor Sampaio, Gregório Callou de Sá Barreto....Além da liderança política do Dr. Leão Sampaio, deputado federal em várias legislaturas e pai do querido médico Mauro Sampaio, que irá ocupar lugar de relevo na história política moderna de Juazeiro E eram todos eles seus parentes ou contra- parentes apoiando o jovem vigário auxiliar da Paróquia de Nossa Senhora das Dores e torcendo pelo seu sucesso. Já no primeiro ano da chegada do Padre Murilo a Juazeiro, a professora Amália Xavier de Oliveira convida-o para o corpo docente da Escola Normal Rural de Juazeiro, composto por um grupo de excelência como o professor Alexandre Passos, Padre Cícero Coutinho, dona Assunção Gonçalves, Maria Lindalva Machado, mestra da língua e literatura luso-brasileira, incentivadora de vocações literárias, Júlia de Figueiredo Nery (Dozinha), Abraão Batista, Dr. Waldetário Motta, Juiz de Direito da Comarca de Juazeiro, dona Quininha, professora de matemática que marcou a história da educação em Juazeiro. Assim, a sala dos professores da Escola Normal Rural era uma tertúlia permanente de saberes conscientes do papel da educação na trajetória atípica da Terra do Padre Cícero. A convivência do Padre Murilo com a juventude de Juazeiro, sonhando sonhos de glória, na Escola Normal de Juazeiro foi de fundamental importância para sua missão, como sacerdote, naquele momento de grande mobilidade social que se alastrava por todo o Brasil e de modo especial com a Igreja Católica abrindo-se para o povo, movida pelos ventos benfazejos do Concílio Vaticano II indicando novos e surpreendentes caminhos da nova evangelização. Nasceu aí a compreensão no coração do jovem sacerdote que o romeiro, o devoto do Padre Cícero são o povo de Deus. Já era antiga tradição em Juazeiro, todas as noites, após a bênção do Santíssimo Sacramento, um pequeno grupo reunir-se na calçada da casa de dona Amália Xavier de Oliveira. O rumo da conversa sem grandes variações centrava-se na reflexão da história de Juazeiro. Tinham assento permanente na “roda da calçada” de dona Amália, Assunção Gonçalves, José Ferreira de Menezes, ex-secretário do Padre Cícero e grande amigo, Madre Nely Sobreira, dona Generosa Alencar, Octávio Ayres e José Geraldo da Cruz, um dos mais antigos militantes políticos de Juazeiro em atividade, além de um ou outro participante eventual. Desde a sua chegada a Juazeiro, o jovem sacerdote Francisco Murilo de Sá Barreto juntou-se a esse grupo que era o guardião da memória da Terra da Mãe de Deus. Foi naqueles saraus fabulosos que o Padre Murilo iniciou o seu imenso mergulho na trajetória histórica do Juazeiro. O assunto era sempre o mesmo: uma reflexão permanente dos fatos que constituem a vasta e complexa história de Juazeiro. Dona Amália estava escrevendo sua obra- prima “O Padre que eu Conheci” e naqueles saraus literários ela tirava suas dúvidas e enriquecia sua obra. O senhor Octávio Ayres escrevia “O Verdadeiro Fundador de Joazeiro”. Em meados de 1963, aquela “roda da calçada de dona Amália” ganhou um frequentador especial, o jovem pesquisador da Columbia University, Ralph Della Cava, que andava vasculhando os baús da intolerância da Arquidiocese do Ceará e da Diocese do Crato “em busca de um milagre”. A grande contribuição do Della Cava, naquele momento, foi incentivar aquele grupo de intelectuais de fundamentar os relatos da tradição com documentação histórica primária que começavam a surgir do fundo de baús da Diocese do Crato e do Colégio Salesiano de Juazeiro. Foi a partir desses momentos de reflexão sobre a memória histórica e de seus fatos fabulosos que o Padre Murilo foi mergulhando na fantástica história do movimento religioso popular de Juazeiro, o mais fenomenal movimento de sincretismo cultural da história do Brasil, e de repente exclama: “Juazeiro tem pouca geografia e muita história”, que é a trajetória do povo romeiro.
PADRE MURILO (VII)
Há um jargão muito repetido por inúmeros estudiosos das Ciências da Religião, dos movimentos da religiosidade popular e por muitos cronistas bissextos que afirma: “Juazeiro é um mundo”. Já ouvi afirmativas que atribuem esse rico jargão ao Padre Murilo. No entanto, há um consenso, sem qualquer contestação, que é de autoria do Padre Murilo a sentença: “Juazeiro tem pouca geografia e muita história.” Joaquim Alves, em percuciente ensaio, Juazeiro, Cidade Mística, (Revista do Instituto do Ceará, LIX, 94-133), afirma: “A Cidade Mística de Juazeiro não tem como limites a área territorial onde se encontra, mas estende-se por todo o sertão do Nordeste, nas orações, nas preces que o romeiro diariamente faz em memória do patriarca”. Já Gilmar de Carvalho, na Apresentação do livro A Floresta do Cordel, estudo entre a História e a Semiótica da Cultura, de Angélica Hölffer (Secretaria de Cultura do Ceará, Coleção Nossa Cultura, Série Pensamento. Fortaleza-2005), diz: “Juazeiro é uma espécie de eixo onde tudo se articula e ganha sentido...” É neste universo maravilhoso e encantador onde a Fé e a tradição foram construindo imagens oníricas com as riquezas culturais do cristianismo e as formas de vivenciar a religiosidade ocupavam o papel central com magnífico sincretismo cultural. O “locus” para onde foi enviado o jovem levita, recém-ordenado sacerdote, Padre Murilo, para iniciar o seu trabalho de pastor de fieis, como vigário auxiliar da Paróquia de Nossa Senhora das Dores, em Juazeiro, era um mundo de fascínio, de encantamento e de incompreensão. Ele tinha vivenciado durante a sua formação eclesiástica, quer no Seminário Menor na Diocese do Crato quer no Seminário Maior da Prainha, em Fortaleza, uma campanha sistemática contra o movimento religioso popular de Juazeiro: tinha como informação que o Padre Cícero ou era embusteiro ou fora um aproveitador de um embuste e que os romeiros eram todos fanáticos e jagunços e que a população de Juazeiro era pobre, inculta, suja, analfabeta e fanática. Logo de início Padre Murilo compreendeu que Juazeiro era um magnífico e surpreendente caleidoscópio com as expressões mais ricas e encantadoras da cultura nordestina herdada do período colonial com tradições ibéricas. Na Escola Normal Rural ele era apenas um jovem professor entre uma juventude generosa e batalhadora que construía sonhos do futuro glorioso, mas mantendo fidelidade às tradições locais e na convivência com o corpo docente, com grande maioria de testemunhas oculares dos fatos e da trajetória de Juazeiro, foi tendo outra visão da caminhada heroica da Terra da Mãe de Deus. Não foi menor a sua surpresa com vigário auxiliar porque o que havia estudado nos manuais da pastoral para orientar o clero, ele já encontrou em pleno funcionamento: irmandades e confrarias religiosas, a catequese da infância e adolescência, a dedicação dos fiéis com a Casa de Deus, pois populares – homens e mulheres – zelavam com esmero a igreja de Nossa Senhora das Dores... No entanto, sua mais grata surpresa foi a grandeza da fé-romeira. Pessoas pobres, simples e até mesmo analfabetas ou com pouca leitura, mas possuidoras de gigantesca riqueza espiritual que tinham o mesmo ardor da devoção ao rosário da Mãe de Deus igual e tão intenso como recomendado por São Luís Maria de Montfort (1673-1716), o excelso pregador das maravilhas da devoção da récita do rosário. O romeiro fez do rosário seu crachá e seu escudo. Compreendeu também Padre Murilo, logo no início do seu apostolado, que os excessos dos penitentes encontravam respaldo na história da Igreja, desde os tempos das catacumbas em Roma e nas tebaidas dos eremitas. Para compreender melhor a generosidade da Fé dos romeiros, fez-se também romeiro e num pau-de-arara, acompanhou um grupo de romeiros do interior do Estado de Alagoas até Juazeiro, não na boleia do caminhão, mas no banco duro e sem encosto com todos os incômodos da longa viagem por estradas carroçável e sem asfalto. Naquele percurso de 150 léguas, acomodado nos bancos de madeira do pau-de-arara, rezando e cantando os mesmos benditos, Padre Murilo vivenciou a grandeza da devoção do povo romeiro. A partir daquela viagem de romaria, Padre Murilo trocou o barrete eclesiástico por um surrado chapéu de palha e, a partir daquele momento, ele foi proclamado – “Vigário dos Romeiros”
PADRE MURILO (VIII)
Aquela viagem romeira realizada pelo Padre Murilo de União dos Palmares (AL) para Juazeiro, num caminhão pau-de-arara, acomodado sem distinção como todos os outros romeiros, num rústico banco de madeira que nem encosto para as costas tinha, trafegando cerca de 150 léguas por mal cuidadas estradas de chão batido, naquele final de janeiro banhado pelas copiosas chuvas de verão foi uma surpreendente e maravilhosa revelação. Haviam lhe inculcado, no curso de sua formação eclesiástica, que as práticas romeiras eram ritos de grosseiros fanatismos, praticados por homens incultos, que poderiam contaminar de alguma maneira, talvez até irreparável, a pureza da Fé, objeto de fervoroso zelo de toda a Cúria Romana assegurado pelo Dogma da Igreja da Infalibilidade Papal, proclamado pelo Papa Pio IX. Padre Murilo queria viver plenamente aquela experiência para poder orientar com segurança, dentro dos Dogmas Católicos, os humildes e sinceros devotos do Padre Cícero que vinham de lugares tão longes ao Juazeiro proclamar as glórias da Mãe de Deus, agradecer graças alcançadas por sua intercessão e pedir auxílio e proteção para seguirem no caminho do Bem, da Verdade e da Fé em Cristo Nosso Senhor. Padre Murilo cercou de muitos cuidados, evitando toda e qualquer divulgação, de sua participação no grupo de romeiros de União dos Palmares para a Romaria de Nossa Senhora das Candeias. Ele queria participar nas mesmas condições dos romeiros e temia inibir a naturalidade habitual daquela gente simples com sua presença. Somente na saída de União dos Palmares é o grupo ficou sabendo que ele vinha no mesmo pau-de-arara. Nos primeiros momentos da viagem, ele ficou maravilhado com a piedade e fervor religioso de todo o grupo e pouco tempo depois percebeu que estava participando e cantando mesmo baixinho o Ofício de Nossa Senhora. Por volta do meio dia, houve uma parada e todos desceram do pau-de-arara. O sol estava escaldante e um romeiro aproximou-se do Padre Murilo e ofereceu-lhe um chapéu de palha. Quando o Padre Murilo pôs o chapéu na cabeça e seu companheiro de romaria disse com um sorriso largo e feliz: “o Senhor agora é romeiro”. Na convivência daquela romaria ele compreendeu que aquela gente simples, pobre, humilde e desassistida era também o povo de Deus, detentora de uma Fé sólida e inquebrantável. Elegeu aquela gente humilde, mas gigante na Fé como centro e motivo de seu apostolado. O povo romeiro elegeu Padre Murilo como o Vigário dos Romeiros. Incentivado pelo Arcebispo do Ceará. Dom José de Medeiros Delgado, Padre Murilo dedicou-se em tempo integral ao estudo do movimento religioso popular de Juazeiro e da história de vida do Padre Cícero. Em Fortaleza, Dom Delgado havia reunido um seleto grupo de intelectuais católicos, entre os quais estavam Parsifal Barroso, Raimundo Girão, Fernandes Távora, Luís Sucupira, Rachel de Queiroz, José Aurélio Câmara, General Carlos Studart, Padre Tibúrcio Granjeiro, Irmã Marciana Maria, dentre outros, sob a coordenação do Padre Azarias Sobreira. Esse grupo ilustre reunia-se na Sala de História Eclesiástica do Seminário da Prainha. Teve larga repercussão na imprensa de Fortaleza o fato relacionado com o depoimento dado por Rachel de Queiroz numa das reuniões desse Ciclo de Estudos. Rachel de Queiroz relatava suas lembranças do primeiro encontro que tivera com o Patriarca de Juazeiro e recordando o carinho com fora recebida não resistiu às emoções e caiu em pranto. Padre Murilo transformou a Casa Paroquial em um dinâmico centro de pesquisa e divulgação reunindo a juventude de Juazeiro em busca de tudo o que compusesse a documentação histórica da Terra do Padre Cícero: fotos, cartas, bilhetes, artigos publicados nos jornais e revistas, mapas e tudo o que se referisse ao Juazeiro antigo. Era uma oficina maravilhosa a produzir e a divulgar a história de Juazeiro. Sei que faltam muitos nomes desse grupo de jovens que se reunia na Casa Paroquial, e pedindo perdão pela falha de minha memória, cito apenas alguns: Renato Casimiro, Daniel Walker, Renato Dantas, Wellington Amorim, Raimundo Araújo, Fátima Menezes e Maria do Rosário.... Esse movimento de refletir a história de Juazeiro empolgava a todos a ponto de Dom José de Medeiros Delgado, Arcebispo do Ceará, elaborar documento dirigido à Nunciatura Apostólica do Brasil, sugerindo a criação da Prelazia de Juazeiro, composta apenas dos municípios de Juazeiro e de Caririaçu, e sugerindo o nome do Padre Francisco Murilo de Sá Barreto como seu primeiro bispo.


ARTIGO:
PAPA FRANCISCO RECONHECE O PADRE CÍCERO E VALORIZA A NAÇÃO ROMEIRA
Por José Carlos dos Santos 
Professor de Filosofia da URCA/IFCE, Comissão de Pastoral de Romaria)

É Tempo de um novo advento! Tempo de Misericórdia! Neste momento histórico, o Papa Francisco surpreende a todos e envia uma mensagem de reconhecimento Pastoral e Religioso ao Padre Cícero Romão Batista. Ao mesmo tempo, inspirado pela força do espirito de Deus, faz uma convocação a Igreja a uma atitude de reconciliação com os Afilhados do Padre Cícero, os Romeiros da Mãe de Deus. Para o povo de Juazeiro e a nação romeira, talvez seja o maior gesto de amor neste ano da misericórdia. Esse documento tem um imenso valor simbólico e faz o reconhecimento das virtudes humanas, cristãs e sacerdotais do santo popular nordestino: o Padre Cícero. Neste sentido, abandona-se a concepção de uma ideia de “reabilitação canônica eclesial” e se constitui essencialmente numa reconciliação histórica da figura do Padre Cícero. O Papa Francisco está reconhecendo o Padre Cícero como modelo de sacerdote, que por meio de sua vida apostólica, transformou-se no seguidor e discípulo de Cristo e sua vida é testemunha da pregação e vivência do evangelho. Olhando para a história de vida do Padre Cícero encontraremos sinais concretos de entrega, doação e serviço aos outros. Ele acolhia a todos que chegavam na sua casa. Um homem nas circunstâncias do seu tempo, estava preocupado com a situação do seu povo que vivia o flagelo da seca. Diante das doenças graves da sua gente, revela um gesto de amor. No esforço de compreender a mensagem do Papa Francisco, encontramos respostas que até hoje inquieta a todos nós e desafia a academia e os pesquisadores do Padre Cícero: afinal, E..Quem é ele? O Papa Francisco responde:
"Viveu uma fé simples, em sintonia com o seu povo”;
"Deixou marcas profundas no povo nordestino a intensa devoção do Padre Cícero à Virgem Maria;
“Educador da sensibilidade católica”;
“Oração e o respeito pelos mortos”;
“Atitude em acolher a todos, especialmente aos pobres e sofredores, aconselhando-os e abençoando-os”
“Movido por um intenso amor pelos mais pobres e por uma inquebrantável confiança em Deus”
“Agia segundo os ditames da sua consciência em momentos e circunstâncias bastantes difíceis.”
“Movido por um desejo sincero de estender o Reino de Deus”

Neste contexto, o Papa revela os traços da personalidade do Padre Cícero nos aspectos humanos e revela um sacerdote virtuoso. Essas afirmações reconhecem as virtudes do Padre Cícero que o fez dele admirado e amado pelo povo nordestino. O papa interpretou com muita fidelidade e autenticidade o sentimento do povo nordestino e sua profunda relação com o padrinho e conselheiro Padre Cícero. Deste modo, podemos entender que essas atitudes de vida e suas virtudes são os verdadeiros sinais de santidade. No programa a sombra do Pé de Juá no dia 31 de agosto na rádio Padre Cícero, abrimos o espaço para os ouvintes e internautas manifestarem sua opinião sobre as virtudes do Padre Cícero, que eles consideravam muito relevante. Em síntese, eles responderam:
“Amor a Jesus, especialmente na Eucaristia;
Devoção e entrega total a Nossa Senhora das Dores;
Compaixão e amor aos pobres, sem trégua, seguindo a ordem de Jesus;
Fidelidade à Igreja Católica da qual nunca se afastou;
Grande conselheiro, segundo os ensinamentos do evangelho e da igreja;
Humildade e paciência nas provações;
Pacificador nos sertões;
Fé inabalável na misericórdia de Deus: valorização do sacramento da penitência, da reconciliação.
Paz interior que não era deste mundo mas de Deus;
Vida segundo o espírito de Deus: perdão, pureza, consolação, entrega total e fé na divina providência.”
Indiscutivelmente, encontramos a convergência entre o pensamento do Papa e a consciência do povo sobre o padre Cícero. Essa sintonia na compreensão das virtudes humanas e sacerdotais do Padre Cícero confirma e fortalece a dimensão mística da vida do Padre e sua obra multidimensional na construção de uma cidade fundada na força da oração e pelo trabalho. O sonho do Padre é que que, em Juazeiro, cada casa seja um “santuário” e uma “oficina”, juntando sempre oração e trabalho. Isso faz de Juazeiro um espaço sagrado para os romeiros e o Padre Cícero, o seu padrinho, protetor e conselheiro. Adentrando na interpretando do documento, vamos encontrar afirmativas de reconhecimento das romarias e do romeiro. O papa destaca “o entusiasmo das multidões que acorrem, anualmente a Juazeiro”. Essa constatação é fundamental, pois demonstra a compreensão do fenômeno das romarias. Valorizam-se as expressões da piedade popular protagonizadas pelo romeiro nas suas orações, na sua devoção a Mãe das Dores, nos seus gestos e no canto dos seus benditos que o documento afirma: “O entusiasmo e o fervor com que os romeiros entoam estes hinos ecoam pelo nordeste brasileiro, como um convite constante a uma vida cristã mais coerente e fiel”. Neste processo de reconciliação da Igreja com o Padre Cícero e o reconhecimento dos romeiros, o documento acentua as iniciativas populares de uma evangelização encarnada na vida e na realidade do povo. Destaca-se a devoção mariana, a participação na missa em memória ao Pe. Cícero, a busca pelo sacramento da penitência, oração pelos fieis falecidos e as romarias como “bela expressão de fé”. Lembrando sempre que os romeiros são os protagonistas da sua romaria nas suas expressões mais sublimes e autentica religiosidade. Ao mesmo tempo, o documento ressalta a necessidade de uma ação evangelizadora da Igreja através da diocese de Crato de acolhimento, valorização e respeito a expressão do povo-romeiro. A vida do Pe. Cícero e a experiência de fé dos romeiros devem ser reconhecidas como referências de uma nova evangelização. Não se pode ignorar ou ser indiferentes. A igreja é convidada “a uma atitude de saída, ao encontro das periferias existenciais”. Nesta afirmativa, o papa reconhece o espirito de acolhimento e os conselhos do Padre Cícero aos pobres e sofredores do nordeste como “um sinal importante e atual” da ação evangelizadora da Igreja no Brasil. Portanto, o documento enviado pelo Vaticano a Dom Fernando, assinado pelo Secretário de Estado como expressão da vontade do Papa Francisco é um marco histórico na relação da Igreja Hierarquia com o Padre Cícero e as romarias de Juazeiro. Ele promove a valorização da vida, da pessoa e da ação do padre Cícero na sua missão religiosa e pastoral. Ao mesmo tempo, convoca a Igreja Católica a um gesto de reconciliação com o próprio padrinho Cícero e a nação romeira. A atitude do papa Francisco é um ato de desprendimento, um gesto de humildade, perdão e misericórdia e revela para a história que o Padre Cícero é um homem de Deus, comprometido e solidário com seu povo e suas virtudes são sinais de esperança e de vida e que na verdade ele é santo na mente e no coração dos seus romeiros. 
VIVA MEU PADRINHO CICERO!

FUNDAÇÃO DE JUAZEIRO DO NORTE
Na edição passada desta Coluna fizemos a publicação de um ato da época do prefeito Carlos Cruz, como abaixo novamente transcrevo, uma vez que foi publicada no Diário Oficial do Município (03.12.2015). Infelizmente não foi dada qualquer explicação pelo executivo, de que forma deverá ser utilizada aquela razão social, e com qual propósito. Chamo a atenção da Câmara Municipal para averiguar. LEI N.º 1.439/89 de 09 de maio de 1.989 EMENTA: Autoriza o Chefe do Poder Executivo Municipal a instituir a Fundação Juazeiro do Norte e adota outras providências. O PREFEITO MUNICIPAL DE JUAZEIRO DO NORTE faço saber que a CÂMARA MUNICIPAL decretou e eu sanciono e promulgo a seguinte Lei: Art. 1.º - Fica o Chefe do Poder Executivo Municipal autorizado instituir a FUNDAÇÃO JUAZEIRO DO NORTE, através de Estatuto e Regime Interno, que juntamente com Lei específica disciplinará o seu funcionamento. Art. 2.º - Revogadas as disposições em contrário, esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Palácio José Geraldo da Cruz, em Juazeiro do Norte, Estado do Ceará, aos 09 (nove) dias do mês de maio de 1.989. Carlos Alberto da Cruz Prefeito Municipal